GRAND DESIGNS



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THE BIG MONEY  GRAND DESIGNS  MANHATTAN PROJECT


GRAND DESIGNS

A to B -
Different degrees...


So much style without substance
So much stuff without style
It's hard to recognize the real thing
It comes along once in a while

Like a rare and precious metal
Beneath a ton of rock
It takes some time and trouble
To separate from the stock
You sometimes have to listen to
A lot of useless talk

Shapes and forms
Against the norms -
Against the run of the mill
Swimming against the stream
Life in two dimensions
Is a mass production scheme


So much poison in power
The principles get left out
So much mind on the matter
The spirit gets forgotten about

Like a righteous inspiration
Overlooked in haste
Like a teardrop in the ocean
A diamond in the waste
Some world-views are spacious -
And some are merely spaced

Against the run of the mill
Static as it seems
We break the surface tension
With our wild kinetic dreams
Curves and lines -
Of grand designs...
GRANDES PROJETOS

A a B -
Níveis diferentes...


Tanto estilo sem substância
Tanta coisa sem estilo
É difícil reconhecer a realidade
De vez em quando ela aparece

Como um metal raro e precioso
Debaixo de uma tonelada de rochas
Leva tempo e transtorno
Para separar a partir do estoque
Você às vezes tem que ouvir
Muita conversa inútil

Contornos e formas
Contra as normas -
Contra o que é medíocre
Nadando contra a correnteza
A vida em duas dimensões
É um esquema de produção em massa


Tanto veneno no poder
Que os princípios ficam de fora
Tanta preocupação com a matéria
Que o espírito fica esquecido

Como uma inspiração honrada
Observada às pressas
Como uma lágrima no oceano
Um diamante no lixo
Algumas visões de mundo são espaçosas -
E outras apenas espaçadas

Contra o que é medíocre
Estático como parece
Quebramos a tensão superficial
Com nossos sonhos cinéticos selvagens
Curvas e linhas -
De grandes projetos...




Música por Geddy Lee e Alex Lifeson / Letra por Neil Peart


O poder da expressão criativa

A segunda canção de Power Windows é "Grand Designs", um tema de musicalidade bastante otimista e de fortíssimas inserções de sintetizadores, no qual a banda transborda emoção e energia em uma produção encorpada e de climas sempre muito detalhados e variados. O entrosamento dos músicos, novamente, se mostra impecável.

Com grande foco nas sessões instrumentais, as belas melodias oferecidas pelo trio definem "Grand Designs" como uma das composições mais cativantes do disco. Como destaque, temos os vocais de Geddy Lee em excelente forma, especialmente no que tange sua facilidade em viajar rapidamente dos graves aos agudos. A linha pesada e cristalina de sintetizadores funciona muito bem a longo de toda a faixa, que traz guitarras vívidas e um incrível solo de Alex Lifeson, além do baixo e da bateria mais uma vez robustos e fantasticamente entrosados.

"Não me lembro de nenhuma dificuldade com essa canção", diz Geddy. "Uma das melhores coisas de se tocar com a mesma pessoa durante muito tempo é que você acaba estabelecendo um tipo de conexão telepática. Eu e Alex nos conhecemos tão bem musicalmente que sempre surge uma gama de possibilidades em comum. Então, se o ouço indo em uma direção ou se ele me ouve, podemos mudar de direção facilmente. Acho que descobrimos uma maneira de nos complementarmos confortavelmente. É algo que vem com o tempo e com o trabalho, sabendo quando simplificar e quando não simplificar. Às vezes, quando um baixista toca com uma parte ritmicamente difícil na bateria, é hora de simplificar, ajudando a tornar mais consistente o trecho que estamos fazendo. Isso pode ajudar a unir as coisas. Ao mesmo tempo, se há outra linha de bateria mais sólida e fundamental chegando, ela permite que o baixo se estique um pouco e se torne mais ativo. Portanto, é dar e receber".

"Muitas vezes, os caras terão trabalhado musicalmente em algo, fazendo uma fita sem ter nada particular em mente"
, diz Neil Peart. "'Grand Designs' foi feita dessa forma. Eles tinham as ideias musicais definidas e fizeram uma fita para mim com guitarra, teclados e bateria eletrônica. Então, se eu ficasse confuso com algo no qual estivesse trabalhando, pegaria a fita e tentaria fechar minha mente por um minuto para ouvi-la".

"A sequência de abertura tem um dos meus sons favoritos no álbum"
, afirma Geddy. "Há um violão no PPG mutilado e irreconhecível, com som de cítara. Cada refrão apresenta um sequenciamento extenso. O primeiro traz uma sequência de guitarra em loop, já o segundo é uma sequência maníaca de piano de cauda em cluster metálico. Foi ideia de Andy [Richards], soando como ataques no piano de cauda. Andy elevou o nível do som, ele é um grande tradutor para mim. Trouxe um efeito profundo. Foi uma boa aventura esticar os limites de produção".

"A maior parte de 'Grand Designs' traz uma guitarra que não foi dobrada"
, explica Alex. "Foi possível colocá-la através de um AMS [processador digital] em torno dos 40 milissegundos, dividindo-a nos canais esquerdo e direito. Lembro que fizemos isso com o salto ecoante no primeiro verso, onde a guitarra solo está no meio e a linha harmônica do lado externo. Foi bastante simples, exceto para os violões no segundo refrão".

"Uso o whammy em alguns momentos. Fui muito influenciado por Allan Holdsworth há alguns anos, pela maneira com que usava a alavanca para alterar notas e movimentá-las. Isso me deixou interessado em usar e tentar desenvolver um estilo"
, conclui.

"Grand Designs", da mesma forma que as demais faixas que compõem Power Windows, observa uma forma de poder. Novamente munido por um forte teor de individualismo, Peart exercita nessa canção algumas belíssimas metáforas que desenham suas ponderações sobre a busca profunda e incessante pela genuína expressão criativa pessoal. A falta de substância e de integridade e a superficialidade em todo o alvoroço de informações, ideias e declarações que nos cercam a todo o momento engendra aqui uma crítica ácida sobre os posicionamentos vazios e condicionados nos quais grande parte da humanidade se encontra e se acomoda.

"Sim, essa foi a primeira canção na qual começamos a trabalhar e é sobre o poder das ideias, e o que as pessoas podem fazer com as mesmas - como transformá-las em realidade", explica Alex. "Também tocamos no ponto do que pode acontecer quando ideias e projetos caem em mãos erradas".

Em "Grand Designs", algumas dicotomias são definidas entre o estilo sem substância ("style without substance") e a realidade ("the real thing") e entre o medíocre ("the run of the mill") e um diamante no lixo ("a diamond in the waste"). A canção proporciona uma exortação para nadarmos contra a corrente ("swim against the stream") e vivermos nossas vidas buscando nossas próprias percepções. Se não o fizermos, representaremos apenas mais um papel no esquema de produção em massa ("mass production scheme").

Perguntado sobre o motivo do constante individualismo em suas letras, Peart diz que os anos que passou em Hamilton no Canadá durante a infância e adolescência foram definitivos. "Descrevo aquela conjuntura como muito conformista. A escola que frequentei tinha apenas três caras de cabelos longos e roupas estranhas, e que estavam no rock and roll. Eu era um deles, e os atletas populares de lá riam de nós. Era a individualidade contra a conformidade".

Um dos traços mais marcantes nos álbuns do Rush na década de 1980 concentra-se nas canções de abertura, que sempre representaram um hino para o conceito geral dos discos, tanto musicalmente quando liricamente. Esse foi o caso de "The Spirit Of Radio" (de Permanent Waves, 1980), "Tom Sawyer" (de Moving Pictures, 1981) e "Distant Early Warning" (de Grace Under Pressure, 1984). Porém, com Power Windows, o trio optou por iniciar o trabalho com a ideia singular de "The Big Money", ao contrário de tomadas mais amplas como em "Grand Designs", a faixa seguinte. "'Grand Designs' seria, provavelmente, a faixa de abertura mais adequada; damos muita importância à ordem de apresentação", explica Peart. "Brincamos com cada alternativa mas, no final, foi impossível de ignorar 'Big Money'. Sua entrada dinâmica esmaga todo o resto em insignificância".

Da mesma forma que em "The Big Money", o título de "Grand Designs" também vem da admiração de Peart pelo escritor norte-americano John Dos Passos, dessa vez baseado no romance The Grand Design, de 1949. O livro retrata o período do New Deal, série de programas implementados nos EUA entre os anos de 1933 e 1937 sob o governo do presidente Franklin Delano Roosevelt (1882 - 1945), que objetivava recuperar e reformar a economia norte-americana assistindo aos prejudicados pela Grande Depressão. Dos Passos escreve sobre o New Deal ainda em Washington, antes do foco do programa ser transferido a níveis nacionais e internacionais. Ele aborda o caos da política contemporânea, dos ciúmes gerados pelo dinheiro nos poderosos e das vantagens tiradas naquela suposta mina de ouro, tudo antes dos discursos sobre a graça salvadora e a crença política que buscava a retomada do crescimento e ajuda aos oprimidos.

Com "Grand Designs", o Rush se preocupa com ideias que nascem apenas como elementos de conveniência, avaliando a qualidade de grande parte do que é declarado - seja na mídia e em seus diversificados veículos ou até mesmo entre pessoas comuns, dentro de suas relações cotidianas. Em muitos dos casos, o estilo chamativo, vazio e superficial é colocado acima da substância, e ficamos cada vez mais longe de distinguir o que real e importante em meio à enxurrada de inutilidades que nos envolve. O letrista ainda nos instiga a sermos inconformados, metódicos e criteriosos nas análises sobre tudo o que chega aos nossos ouvidos.

Muito além de um tom de ensinamentos ou persuasão, "Grand Designs" propõe reconhecimento. A opinião pública, os valores herdados, os slogans políticos e os dogmas religiosos pressionam nosso próprio pensamento crítico, fazendo com que nos rendamos e marchemos em lealdade baseados nesses direcionamentos, bloqueados pela conformidade das massas e negando uma existência autêntica.

"Grand Designs" é mais um forte exemplo de exaltação ao individualismo e à força do ser humano na obra do Rush. A canção expõe a fidelidade a si mesmo e o nadar contra a corrente. A maioria das pessoas está presa a uma vida apenas bidimensional (no mundo real, qualquer superfície palpável é formada por pelo menos três dimensões), da qual é preciso coragem e iniciativa para se libertar. A composição provoca a ideia do "pensar fora da caixa", tendo a ambição de romper com a inércia para criar algo de fato autêntico, através do precioso poder da expressão criativa.

© 2015 Rush Fã-Clube Brasil

POLLOCK, B. "The Songwriting Interview: Neil Peart". Guitar For The Practicing Musician. October 1986.
PUTTERFORD, M. "Pane and Pleasure". Kerrang! Nº 107. November 14-27, 1985.
MULHERN, T. OBRECHT, J. "Geddy Lee Of Rush: Rock's Leading Bassist - Alex Lifeson Of Rush: The Evolving Art Of Rock Guitar". Guitar Player. April 1986.
STERN, P. "Baroque Cosmologies In Their Past, The Boys Focus On 'The Perfect Song'". Canadian Musician. December 1985.
TOLLESON, R. "Geddy Lee: Bass Is Still The Key". Bass Player. November / December 1988.
SHARP, K. "A Parallax View / On Their Latest Opus, Power Windows, Rush Conduct An Extensive Study Of Power And Its Many Manifestations From Two Opposing Perspectives: Good And Evil". Music Express. December 1985.