17 DE JULHO DE 2014 | POR VAGNER CRUZ
A revista britânica Classic Rock lançou em julho de 2014 uma edição especial de 244 páginas para comemorar seu número 200, trazendo duzentas entrevistas dividas por assuntos específicos com vários artistas do rock. Na seção Família está Geddy Lee. O foco da conversa é a vida do músico como esposo, pai e parceiro de trabalho, material que acabou rendendo ótimas revelações. Confira o texto inteiramente traduzido.
O HOMEM DO RUSH NA VIDA E NO AMOR FORA DA BANDA
Classic Rock - 16 de julho de 2014 | Por Mark Beaumont / Tradução: Vagner Cruz
Como seus pais reagiram quando você disse que queria ser músico?
Foi difícil para minha mãe aceitar. Ela é da Polônia e uma sobrevivente dos campos de concentração nazistas da Segunda Guerra Mundial. Quando chegaram ao Canadá, o sonho dos meus pais era escapar dos horrores do passado e ver seus filhos crescerem e serem profissionais em alguma área - médicos, advogados ou algo que tivesse estabilidade - não músicos.
Você descobriu mais tarde que seu pai havia sido músico?
Infelizmente o perdi quando tinha apenas 12 anos. Mais tarde, ouvi uma história de uma tia que ele tinha uma balalaica e que queria trazê-la para seu novo país. Acho que minha mãe não queria que o instrumento fizesse a viagem. Outros parentes disseram que ele chegou a tocar em alguns Bar Mitzváh e casamentos, mas sempre manteve seu amor pela música escondido de nós. Isso ainda me deixa triste.
Sua mãe mudou de ideia?
Sim, mas foi uma transição dolorosa. Ela não equiparava a música que eu tocava com música, mas com um estilo de vida que me traria ruína, drogas e assim por diante. Minha avó ainda estava conosco naquele momento, tomando conta de nós enquanto minha mãe trabalhava. Alex e John Rutsey vinham ensaiar comigo no porão, e isso a deixava louca também. Ela achava que éramos demônios.
Você e sua esposa são casados há 38 anos. Isso é uma vida em anos dentro rock. Qual é o segredo?
Tomamos juntos a decisão de termos esse trabalho com a banda, mas houve momentos difíceis. Estivemos por um triz na época em que meu filho era pequeno e nossa agenda de shows frenética. Minha esposa e eu nos conhecemos há muito tempo, mas não importa o quão bem intencionado você é. Quando se é ausente, fica muito difícil continuar casado.
Era difícil se adaptar à vida em família depois de estar na estrada?
Ao voltar da turnê não era tão difícil para mim, mas a ausência criou enormes lacunas na capacidade de nos comunicarmos. Você acaba desenvolvendo independência, e é difícil unir esse espaço agindo como par, ao invés de dois artistas solo. Estou muito feliz por ter minha esposa. Eu a adoro e somos os melhores amigos um pro outro.
Tem sido fácil manter o Rush unido apenas com vocês três?
Definitivamente. Achamos bem fácil a forma como nos comunicamos.
Você e Alex se conhecem desde a escola. Quando Neil chegou se sentiu um pouco de fora?
Acho que ele se sentia alheio ao comprimento e profundidade da minha relação com Alex. Somos como irmãos. Demorou um pouco para trazermos Neil para o rebanho. Mas, com o passar do tempo, você vai se encantando com o novo cara, e não há nada como os altos e baixos da vida em uma banda de rock para forjar amizades profundas.
Alguma vez vocês consideraram adicionar um quarto integrante?
Consideramos isso. Sou primeiramente um baixista, em segundo um vocalista e um tecladista em um distante terceiro lugar. Mas tive momentos no início dos anos oitenta, quando estava fazendo mais e mais nas minhas atividades, que me sentia como um homem se afogando. Isso aconteceu devido a tecnologia que se desenvolveu ao nosso redor, mesmo que Alex e ainda Neil pudessem ajudar. Nos desenvolvemos como uma banda de três homens, e eu sentia que era como uma banda de um homem só.
Já houve algum momento em que vocês se desentenderam um com o outro?
Nós nunca nos separamos como amigos, mas tivemos momentos em que havíamos passado muito tempo na estrada precisando de um tempo separados. Após o início dos anos oitenta, quando os teclados assumiram um papel mais profundo na banda, Alex estava frustrado e sentiu a necessidade de afirmação, fazendo o álbum solo Victor, de 1996. Ele precisava entrar em contato consigo mesmo.
Seu álbum solo também foi uma fuga do Rush?
O meu veio de um lugar diferente. Eu tinha a intenção de fazer algo quando o Rush caminhava para sua próxima pausa, em 1997. Mas isso foi bem na época em que uma terrível tragédia atingiu a vida de Neil, e tudo voltou a ficar em segundo plano. Quando a poeira baixou, achava que era o fim da banda, e a ideia do álbum solo se ergueu novamente - como uma maneira de permanecer saudável.
Você é um bom pai?
Minha mãe era uma mulher muito forte, que criou três crianças contra todas as probabilidades. Ela foi uma inspiração. Criamos nossos filhos em um mundo em paz. Nós não os criamos no colo do luxo, mas tivemos meios de mandá-los para boas escolas e tempo para sermos pais. Minha mãe nunca tinha tempo enquanto trabalhava.
Seus filhos são fãs do Rush?
Acredito que não! Acho que foi difícil para o meu filho, quando era um adolescente no Canadá e onde somos considerados mainstream. Foi difícil para ele ser independente na escola, então tentou criar uma vida longe de ser meu filho. Ele é um acadêmico agora e estou muito orgulhoso disso, estando prestes a se tornar pai. Acho que foi mais fácil para minha filha, por ser uma menina numa escola para meninas, porque lá elas não estavam tão preocupadas com o Rush e com meu estilo de música.
Então Geddy Lee está prestes a se tornar um avô?
Estamos nos preparando para isso. Temos adiado por muito tempo.