THE WEAPON (PART II OF FEAR)



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THE WEAPON (PART II OF FEAR)

We've got nothing to fear - but fear itself?
Not pain or failure, not fatal tragedy?
Not the faulty units in this mad machinery?
Not the broken contacts in emotional chemistry?

With an iron fist in a velvet glove
We are sheltered under the gun
In the glory game on the power train
Thy kingdom's will be done

And the things that we fear are a weapon to be held against us...

He's not afraid of your judgement
He knows of horrors worse than your Hell
He's a little bit afraid of dying -
But he's a lot more afraid of your lying

And the things that he fears
Are a weapon to be held against him...

Can any part of life - be larger than life?
Even love must be limited by time
And those who push us down that they might climb -
Is any killer worth more than his crime?

Like a steely blade in a silken sheath
We don't see what they're made of
They shout about love, but when push comes to shove
They live for the things they're afraid of

And the knowledge that they fear
Is a weapon to be used against them...
A ARMA (Parte II da quadrilogia 'MEDO')

Não temos nada a temer - senão o próprio medo?
Nem a dor ou fracasso, nem uma tragédia fatal?
Nem as peças defeituosas desse maquinário insano?
Nem os contatos partidos na química emocional?

Com punho de ferro em uma luva de pelica
Estamos protegidos sob a mira da arma
No jogo glorioso do trem de força
Que venha a nós o vosso reino

E o que tememos é uma arma a ser apontada contra nós...

Ele não tem medo do seu julgamento
Ele conhece horrores piores que seu inferno
Ele sente um pouco de medo da morte -
Mas tem muito mais medo da sua mentira

E as coisas que ele teme
São uma arma a ser apontada contra ele...

Pode alguma parte da vida - ser maior do que a vida?
Mesmo o amor deve ser limitado pelo tempo
E aqueles que nos rebaixam para que possam subir -
Qualquer assassino vale mais que seu crime?

Como uma lamina de aço em uma bainha de seda
Não vemos do que eles são feitos
Eles gritam sobre o amor, mas quando são pressionados
Vivem para as coisas que os fazem sentir medo

E o conhecimento que eles temem
É uma arma a ser usada contra eles...


Música por Geddy Lee e Alex Lifeson / Letra por Neil Peart


O medo como componente primordial do controle exercido por governos e religiões

"The Weapon", segunda parte da quadrilogia Fear, é a quinta composição de Signals. Sendo a faixa mais extensa do álbum, com pouco mais de seis minutos, começou a ser concebida em dezembro de 1981 por iniciativa primordial de Geddy Lee, que desejava criar uma canção de natureza bastante confidencial, experimental e que destacasse texturas amplamente variadas de sintetizadores. Tratava-se de um tipo de projeto ultra-secreto, que ainda provocaria um belíssimo padrão de percussão incrivelmente inovador. Segundo Neil Peart, o resultado de sua marcante performance em "Weapon" nunca teria sido alcançado por ele sozinho.

A proposta incomum dessa composição acabou por surpreender bastante o baterista, principalmente devido sua tomada levemente dançante. O que fica claro mais uma vez é que, quando as mãos de Peart chegam ao instrumento, o produto final é sempre impressionante. Ele chega a brincar com o assunto no tour book do álbum, fazendo menção sobre a sensação perigosa de se aproximar dos ritmos da disco, bastante comuns na época.

Com uma bateria eletrônica Roland e alguns sintetizadores variados, Geddy e um amigo chamado Oscar se entocaram no estúdio de Ged para criar alguma música de caráter confidencial e experimental. Dentre os projetos secretos, os quais produziram a base para essa canção, havia uma batida altamente misteriosa e bizarra, conseguida por Oscar na bateria eletrônica. (Devo aprender tocar aquilo?)

Bem, eu adoro um desafio e, uma vez que começamos a tocá-la nos ensaios, descobri que se tocasse totalmente ao contrário, virando minhas mãos algumas vezes para onde elas normalmente não vão, poderia fazer. A vergonha de ser reduzido a aprender de uma máquina! Entretanto, devo admitir, nunca teria uma ideia dessas por mim mesmo!

Com tudo isso e mais um pouco para ocupar minhas mãos, não havia impedimento para o pé do bumbo tocar um "quatro" curto, algo que eu nunca pensei em fazer. Isso dava a sensação de que a canção chegava perigosamente perto de uma (tremam) canção d-d-d-dance, tipo, você sabe, disco! "Traição! Traição! Matem os traidores! Eles escreveram algo que pode te fazer dançar! Vocês nunca nos perdoarão? Provavelmente não.

Foi divertido fazer, entretanto. É tão contrária ao clima sugerido pela letra, e uma abordagem tão diferente para nós que acaba se tornando uma peça gratificante para nosso trabalho. É uma produção que podemos tocar ao vivo, então tenho certeza que todo o 'pessoal da discoteca' em breve estará presente em nossos shows".


A experimentação em "The Weapon" provoca a ideia de continuidade, a partir da introdução em fade in similar a parte III "Witch Hunt", do anterior Moving Pictures. A composição oferece uma tomada cativante de rock progressivo com uma quantidade significativa de texturas eletrônicas agradáveis, embelezadas por letras poéticas. As frases percussivas intrincadas de Peart e o solo extenso e atmosférico de Alex Lifeson trazem um pulso hipnótico constante - um casamento perfeito.

"Tomando uma canção como 'The Weapon', o padrão de bateria é despudoradamente baseado em um ritmo dançante, com um forte bumbo four-on-the-floor e uma sincopação quase impossível entre o chimbau e a caixa, que tive que aprender arduamente a partir de um padrão de bateria eletrônica composto por um não-baterista", diz Peart. "Tive que tocar a parte do chimbau com minha mão esquerda e aprender a lidar com os sincopados em lugares muito difíceis. Foi um desafio prazeroso de realizar, explorando novas texturas de som".

"Quando Ged e Alex estavam trabalhando nesse estranho padrão rítmico, tive que me duplicar. Era como se eu tivesse que tocar ao contrário - minha mão direita tinha que fazer o que minha mão esquerda sempre fazia, e vice-versa. Enquanto isso, tinha que fazer algo totalmente diferente no bumbo. Imagine! Ser reduzido a aprender de uma máquina"!

"Quando compomos uma canção, penso no contexto e em um espaço para o solo"
, explica Lifeson. "Deixo esse espaço lá para isso, onde trabalhamos nos arranjos para que ele se encaixe perfeitamente. Começo os solos uns dois dias depois de prepararmos as faixas básicas no estúdio, trabalhando a partir do zero. Geralmente, é dessa forma que penso pela primeira vez nos meus solos. Toco alguma coisa ocasional enquanto compomos, apenas para preencher esses espaços. Raramente uso qualquer uma dessas coisas. Já em 'The Weapon', utilizei duas ideias que vieram nas sessões de composição. Tento ter uma ideia do que ele deverá fazer para então buscar direções diferentes. Posso buscar algo por horas para então fazer colagens, tocando-o numa sessão completa para ver como se sai. Então reaprendo o mesmo quando me preparo para cair na estrada novamente".

Se "Witch Hunt" olhou para o medo que conflagra a intolerância e a violência, "The Weapon" observa as formas de utilização do sentimento para a manipulação de pessoas. Tendo em vista o momento de criação do disco, que ainda compreendia o período da Guerra Fria, Peart toma metaforicamente as tensões entre governos por meio de questões políticas, militares, tecnológicas, econômicas, sociais e ideológicas com enfoque na consequente insegurança provocada na maior parte dos cidadãos. A corrida aos armamentos ao longo das décadas pós-Segunda Guerra protagonizada pelos Estados Unidos e União Soviética causava um receio recíproco pela certeza de que qualquer desequilíbrio poderia acarretar um verdadeiro apocalipse nuclear. O assunto ainda seria visitado pelo letrista mais diretamente em trabalhos posteriores, apenas abordado em "The Weapon" como figuras para ponderar questões mais específicas.

"'The Weapon' é uma das partes da trilogia na qual venho trabalhando, chamada 'Fear'", explica Peart, na época da preparação de Signals. "Tem a ver com a forma do medo sendo usado como uma arma psicológica contra todos nós. Para tomá-la em meras palavras, lido aqui com religião e com o governo controlado religiosamente - não necessariamente com guerras ou com a corrida armamentista nuclear".

"Bem, as letras parecem vir em primeiro lugar hoje em dia, simplesmente porque elas estabelecem um quadro ou um estado de espírito. Às vezes, os outros caras chegam com muitas ideias musicais que não têm lugar até que a canção seja escrita. Por exemplo, um exercício interessante de justaposição foi 'The Weapon'. Eu tinha essas imagens bem nebulosas e obscuras, e Geddy havia escrito várias seções musicais para ela em casa, como uma espécie de electro-beat, um exercício de dança moderna. Não tínhamos certeza de que utilizaríamos algum dia".

"Devido a Geddy ter que cantar as palavras, muito se resume as minhas decisões com ele. Ele persistiu com a ideia de que devíamos abordar o tratamento novamente, a partir de um ponto de vista muito abstrato, justapondo sua dance music eletrônica com minha letra nebulosa e obscura, fazendo funcionar de alguma forma. Acho que conseguimos. Estou feliz que tenha se assentado nessa qualidade"
.

"The Weapon" avalia o medo sutil, evolvente e até mesmo cultural utilizado para intimidar, subjugar e dominar. Na segunda parte de Fear, os opressores não são os mesmos de "Witch Hunt" - a questão aqui se mostra ainda mais ampla e assustadora. O primeiro verso parte de uma famosa frase do 32º presidente dos Estados Unidos, Franklin Delano Roosevelt (1882 - 1945), retirada do seu discurso de posse ocorrido no dia 4 de março de 1933: "Deixe-me afirmar minha convicção de que a única coisa que devemos temer é o próprio medo. Sem nome, irracional, o terror injustificado que paralisa os esforços necessários para converter o recuar em avançar". Peart, a seguir, apresenta indagações retóricas que ampliam a questão com algumas das mais preocupantes consequências desse sentimento.

A canção trata da pressão proveniente dos medos externos - os mais abrangentes e cotidianos. O cerne de Signals observa o processo de maturidade dos seres humanos e de como esses vão sendo conduzidos a integrar o grande sistema, como peças ínfimas que giram uma máquina colossal abastecida principalmente pela absorção das individualidades. "The Weapon" sugere que instituições como governos e religiões podem ser compreendidas como alguns dos mais importantes mecanismos de manutenção dessa realidade que, principalmente pautadas pelo medo, garantem ciclos de insegurança e impessoalidade praticamente imutáveis, alijando o pleno desenvolvimento do intelecto.

Observando algumas demandas da filosofia cristã, majoritária no ocidente, recebemos nessa canção pontuações bastante diretas (mesmo que poéticas) direcionadas aos seus desdobramentos, elencadas pela figura de um indivíduo profundamente questionador e racional. "The Weapon" é clara na contraposição de um dos mais fortes dogmas propostos pelas religiões convencionais: as ameaças do julgamento teológico. Peart ressalta em sua letra que a realidade já é marcada por uma abundância de horrores bem maiores que o aterrador inferno mítico, como vidas desperdiçadas em variadas instâncias, vidas mutiladas pelo medo e vidas que tentam sobreviver atrás dos muros erguidos por suas mentes escravizadas. A morte, apesar de terrível para muitos, é certa - porém muito pior é viver sob ameaças paralisantes e vazias atribuídas a um Grande Inquisidor. A composição expõe as fortes imposições que visam, acima de tudo, o controle, sempre sustentadas pela supressão da natureza lógica para o alcance da máxima "aceitar pela fé". A segunda estrofe é concluída, inclusive, com a frase "Thy kingdom's will be done", retirada da oração do Pai Nosso "Venha nós o vosso reino, seja feita a sua vontade", esta que legitima os sofrimentos inerentes a vida, as desigualdades e as infalíveis recompensas posteriores, a constar no livro de Mateus, cap. 6 versos de 9-13.

"The Weapon" é construída por um número significativo de afirmações muito contundentes, como "Can any part of life be larger than life?" ("Pode alguma parte da vida ser maior do que a vida?"), esta que evidencia a controversa ideia dos comportamentos que determinam o galardão ou o castigo eterno - atos finitos e temporais trazendo consequências eternas e infinitas. Atitudes particulares, como os ditos pecados, tornam-se miticamente mais significativos que a própria vida. Nesse momento da canção, a contraposição de Peart exemplifica a justiça do sofrimento eterno no inferno reservada a um assassino, algo que seria por si só um crime muito mais impiedoso que aquele cometido - o sofrimento sem fim.

Em contrapartida, alguns "gritam sobre o amor" em pregações de boa vontade, bondade, auto sacrifício, imolação - o tomar a cruz e o morrer para nascer para a vida eterna. Porém, nos inevitáveis momentos de pressões maiores e dificuldades, esses mesmos passam a se direcionar pelo medo, ou seja, na alegação das ameaças de condenação - a arma que sacrifica mentes. Os inquisidores nos parecem compassivos com suas orações piedosas baseadas no amor, mas que, em muitos casos, duram apenas enquanto há a obediência.

"The Weapon" é concluída com a chave para os grilhões do medo: o conhecimento. Finalmente, quando Peart diz, "The knowledge that they fear is a weapon to be used against them" ("E o conhecimento que eles temem é uma arma a ser usada contra eles"), há o encorajamento para a luta pautada no julgamento racional próprio. A banda consegue penetrar com maestria no núcleo dos medos, avaliando que até mesmo a segurança e a estabilidade de sociedades passivas também podem ser consideradas produtos desse sentimento - um amontoado servil que garante interesses e ideais de poucos.

© 2015 Rush Fã-Clube Brasil

PRICE, Carol S. PRICE, Robert M. "Mystic Rhythms: The Philosophical Vision of Rush". Borgo Press, 1999.
INTERNATIONAL MUSICIAN AND RECORDING WORLD MAGAZINE. "Rush 'N' Roll". January 1983.
QUILL, G. "Neil Peart: New World Man". Music Express Magazine. October 1982.
STIX, J. "Alex Lifeson of Rush: Still in School". Guitar For The Practicing Musician. July 1984.