CLOSER TO THE HEART



VOLTAR PARA "A FAREWELL TO KINGS"
VOLTAR PARA DISCOGRAFIA
VOLTAR PARA LETRAS E RESENHAS

XANADU  CLOSER TO THE HEART  CINDERELLA MAN


CLOSER TO THE HEART

And the men who hold high places
Must be the ones to start
To mould a new reality
Closer to the Heart

The Blacksmith and the Artist
Reflect it in their art
Forge their creativity
Closer to the Heart

Philosophers and Ploughmen
Each must know his part
To sow a new mentality
Closer to the Heart

You can be the Captain
I will draw the Chart
Sailing into destiny
Closer to the Heart
MAIS PRÓXIMO DO CORAÇÃO

E os homens que detém altos cargos
São os que devem começar
A moldar uma nova realidade
Mais próxima do coração

O ferreiro e o artista
Refletem isso em sua arte
Forjam sua criatividade
Mais próxima do coração

Filósofos e lavradores
Cada um deve saber sua parte
Semear uma nova mentalidade
Mais próxima do coração

Você pode ser o capitão
Eu traçarei o mapa
Navegando rumo ao destino
Mais próximo do coração


Música por Geddy Lee e Alex Lifeson / Letra por Neil Peart e Peter Talbot


A idealização de uma sociedade que combina talentos individuais

A breve, cativante e radiofônica "Closer To The Heart" é definida, certamente, como uma das canções mais populares já gravadas pelo Rush. De letra poética, sonhadora e sincera, é entregue na voz de Geddy Lee com notável energia. A composição traz um brinde utópico sem amarras que, por sua própria natureza, reflete impactante beleza e emoção.

"Closer To The Heart" foi lançada como single no natal de 1977 e, após duas tentativas frustradas com os discos Fly By Night e Caress of Steel (ambos de 1975), o Rush alcançava enfim um hit no Reino Unido, atingindo a 36ª posição no UK Singles Chart em fevereiro de 1978. Esse feito iniciaria, portanto, o significativo sucesso dos canadenses na Terra da Rainha.

Essa foi a primeira canção do power-trio a trazer um coautor externo. Peter Talbot, mencionado nos créditos do ao vivo All The World's a Stage (1976), é um antigo amigo de Neil Peart que oferece à banda o título e as quatro primeiras linhas da faixa.

"Durante a mixagem do nosso primeiro álbum ao vivo, estive em casa trabalhando em algumas ideias para um novo disco", lembra Neil. "De longe, a maior parte do álbum foi feita no estúdio, e os trechos finais das letras foram escritos durante a última turnê britânica, pouco antes de gravarmos. A primeira que nasceu foi 'Closer to the Heart', que não conseguimos terminar até estarmos no estúdio. Mantivemos sua versão original até o fim. Ela é um pouco diferente de qualquer outra canção que tenhamos feito, pois foi baseada na ideia de outra pessoa. Veio de Peter Talbot, um profissional que trabalha com rádio e mídia e que é um escritor muito prolífico. Cada vez que o visito, ele me entrega uma pilha de coisas como essa para levar para casa. O título de 'Closer to the Heart' e o primeiro verso vêm dele".

Curiosamente, a introdução acústica de "Closer to the Heart" foi composta por Geddy. "Sua maneira melódica de tocar vem de suas composições para o baixo feitas no violão", explica Alex Lifeson. "Ele faz as linhas de baixo de forma acústica e acaba vindo com um monte de coisas para a guitarra também. 'Closer to the Heart', por exemplo - foi ele quem compôs a introdução. Eu ouvi e disse, 'Isso ficou tão legal - me mostre!'".

O trabalho de Alex Lifeson se mostra muito motivador novamente, desde a performance no belo e indelével riff acústico inicial até o trovão monolítico de sua transição para a guitarra. Seu solo, um êxtase alegre que o define como um dos mais marcantes do músico, encanta por sua grande ascensão, ajudando a revelar nessa pequena peça um completo leque das suas inconfundíveis habilidades. "Há muita energia nessa música. Ela é muito positiva", diz.

"Closer to the Heart" oferece uma mensagem valorosa em um formato relativamente simples, porém bastante tocante. Sonhadora, grifa mais um exemplo de dualismo em temas do Rush, com Peart contrastando pares de pessoas bastante diferentes (um ferreiro e um artista, um filósofo e um lavrador, um capitão e um marinheiro) sugerindo que todos têm condições de colaborar na busca por um novo mundo, independente de suas condições e atribuições sociais e profissionais. Segundo o baterista, "Closer To The Heart" oferece, liricamente, algumas respostas da banda para as preocupações levantadas na faixa-título, ressaltando inclusive que as duas letras podem ser tranquilamente conectadas. Em "A Farewell to Kings", Peart observava erros e ações pretéritas de líderes e governantes que, agora com novas roupagens, ainda seguem afetando a humanidade contemporânea - massa que também continua exercendo seus antigos papéis. "Closer to the Heart", portanto, consiste em uma avaliação filosófica e pessoal do músico, uma espécie de sugestão suave baseada em ideias honestas e profundas.

A banda propõe nessa canção uma celebração das artes, dos variados potenciais e das próprias emoções humanas. Mesmo com tantas divergências e incoerências, a ciência, a criatividade e uma vasta quantidade de produções maravilhosas podem representar a chave para a esperança entre os homens, levando ao sonho de um futuro onde as relações serão mais dignas, íntegras e justas. Há certamente a ênfase no papel do trabalho no sentido de cooperação e pertencimento - a integração social retratada é baseada na idealização de complementaridade entre todos os papéis, desenvolvidos aqui como pontos fortes de cada ser humano. O foco, nesse caso, é a exaltação da criatividade em variados os âmbitos da sociedade, esta que pode concretizar o semear de uma nova mentalidade e o alcance do equilíbrio entre o coração e a mente, entre a individualidade e a compaixão. "Closer to the Heart" descreve um cenário de restauração e realização da sociedade global, onde os indivíduos negam a alienação que envolve suas atividades profissionais (talvez tenhamos aqui um ângulo de observação marxista, inesperado e inconsciente), com o trabalho e os talentos se tornando, enfim, alguns dos mais significativos caminhos para o pleno desenvolvimento individual e, por consequência, social.

Inicialmente, a composição aborda os papéis dos governantes e daqueles que detém os altos cargos - as altas vozes - ressaltando o que deveria ser uma das mais prioritárias responsabilidades e preocupações em suas ações: a busca pela harmonia entre as pessoas. Logo após, no segundo verso, temos o contraste e a aproximação entre as atividades de um ferreiro e um artista que, mesmo tão diferentes, trabalham no desenvolvimento e aprimoramento da criatividade através de sua arte. Há também a interessante junção das figuras dos filósofos e lavradores, que de fato podem influenciar outras mentes, cada qual semeando novas idéias em seu próprio ambiente e convivência. E, por fim, o esforço por esses objetivos devem ser trabalhados em cooperação, com o exercício de funções em acordo por um bem maior.

Com A Farewell to Kings, o Rush já defendia o alto nível intelectual de suas composições como uma das suas mais fortes marcas, porém, "Closer To The Heart" se dedica a mais um elemento: emoções imediatas na afirmação de que todos os homens, dos poderosos ou sábios aos mais humildes, ainda são capazes de portar os anseios e o potencial para construção de uma nova realidade, bastando ouvirem sua própria humanidade. O trio novamente personifica a qualidade rara na natureza dos homens de olhar para trás, aplicar o que foi aprendido e continuar seguindo em frente, na esperança de que essa aprendizagem contribua por tempos mais pacíficos, para a superação de dramas que persistem na longa história das relações humanas.

"Closer to the Heart" distribui responsabilidades no campo das possibilidades, incitando que estas poderiam ser inerentes a cada ator social na superação da apatia, do descompromisso, do pessimismo e da ganância pelo poder ou controle na perpétua manutenção de antigos moldes, esses que afastam e que sufocam a liberdade e a plenitude dos homens. O tema apresenta ideais que muitos possam considerar utópicos, porém, conforme as palavras do escritor inglês Oscar Wilde, não seria o progresso uma realização de utopias? Peart certamente não negaria essa natureza em sua composição, assim como não abriria mão de seus posicionamentos essencialmente individualistas, exibindo abertamente um cenário que ele compreende como o do real amadurecimento entre as pessoas que, unidas em suas diferenças, poderiam enfim alavancar um novo renascimento social. É bem verdade que nossas lideranças estão doentes, assim como nossas próprias vivências, atitudes e relações, e a ideia nesse tema é exatamente imaginar uma possibilidade de envolvimento entre cada indivíduo criativo para a gradativa e, por fim, definitiva superação de dilemas, frisando que muitos trazem o potencial para participarem da contribuição por um novo mundo. Trata-se, portanto, de uma sugestão imaginativa bastante pessoal sobre uma nova realidade, de fato, mais próxima do coração.

Nessa pequena e poética canção, o Rush propõe a idealização de uma era de mudanças, uma época drasticamente nova. Há o ressaltar do sentimento de completude e complementaridade em várias facetas da vida, além da crença e do otimismo de que os homens ainda trazem em sua essência sentimentos capazes de tornar as relações mais complacentes, a partir da aproximação e da união de talentos. A proposta de Peart e do Rush em "Closer to the Heart" revela uma sincera sugestão de unidade e mudança, jamais enganosa. Todos, em suas próprias atribuições e realidades, poderiam cooperar para uma existência mais harmoniosa, abordando a união de algumas das diversas e maravilhosas vocações humanas. Trata-se de um convite a um mundo imaginado que, ao mesmo tempo, expõe uma critica tácita sobre como temos desenvolvido nossas relações, ainda com muitos espaços para serem preenchidos.

© 2014 Rush Fã-Clube Brasil

POPOFF, M. Contents Under Pressure. Canada: ECW Press, 2004.
PRICE, Carol S. PRICE, Robert M. "Mystic Rhythms: The Philosophical Vision of Rush". Borgo Press, 1999.
BANASIEWICZ, B. Rush Visions: The Official Biography. Omnibus Press, 1987.