11 DE DEZEMBRO DE 2015 | POR VAGNER CRUZ
No começo da semana, recebemos a notícia que Neil Peart seria um dos destaques da edição de novembro / dezembro da revista norte-americana Drumhead. O material, na verdade, consiste em um ensaio escrito pelo próprio baterista, no qual reflete sobre seus 50 anos exercendo a atividade. Inicialmente, um pequeno trecho desse artigo foi liberado na Internet, no qual Peart anuncia claramente sua aposentadoria. Logo, vários sites especializados publicaram a declaração como se o músico estivesse encerrando sua carreira por completo. Porém, a seguir, Geddy Lee desmentiria o fato, concedendo uma pequena entrevista para a Prog Magazine e reafirmando o que já entendemos ao longo das inúmeras entrevistas e matérias anteriores (links para as mesmas no fim da página): Neil Peart está se aposentando apenas das grandes turnês com o Rush.
"Não há nada pra dizer", diz Geddy. "Acho que Neil está explicando suas razões em não querer mais fazer turnês, pois seu corpo está pagando o preço. Isso é tudo que tenho para dizer sobre o assunto. Por fim, vamos nos encontrar e conversar sobre as coisas. Mas, na minha opinião, não há nada realmente surpreendente no que ele disse. Aparentemente, Neil só sente que tem que se explicar para todas as milhares de pessoas que perguntam, 'Porque não fazer mais turnês?'. Ele precisa explicar seu lado".
Perguntado se sente que a declaração de Peart foi divulgada fora do contexto, Lee acrescenta: "Com certeza sim. É o trabalho deles - falar sobre algo quando não há nada para falar".
O diretor geral da Ole, Andy Curran, empresa canadense que acabou de adquirir as operações da Anthem/SRO Entertainment (estas que gerenciaram por décadas os negócios do Rush), ofereceu durante a semana uma curta e importante declaração sobre os planos futuros do Rush. "Até onde eu sei é apenas um rumor", respondendo ao jornal Toronto Star e a outros veículos de comunicação. Curran confirmou que a banda teria o compromisso de lançamento de um DVD ao vivo da R40 (liberado em novembro) e, pelo menos, mais um projeto de estúdio.
Com todas essas importantes atualizações (que podem ajudar na melhor compreensão de todo o cenário), oferecemos o ensaio completo de Peart para a Drumhead, inteiramente traduzido para o Rush Fã-Clube Brasil.
NEIL PEART REFLETE SOBRE SEUS 50 ANOS BATENDO EM COISAS COM BAQUETAS
Drumhead Magazine / Novembro e Dezembro de 2015 - Por Neil Peart
Não sendo alguém para celebrar "ocasiões" pessoais, fico sempre contente e tranquilo em assinalar marcos como aniversários em particular. Não que eu os negue - em cada setembro, fico orgulhoso e grato por ter sobrevivido mais um ano e, ultimamente, aos sessenta e três anos de idade, por estar na minha sétima década. Não gosto de fazer muito barulho ou de lidar com isso como uma grande coisa.
Por essa razão, foi em alguns dias depois que percebi que havia passado por meu quinquagésimo aniversário tocando bateria - em um show no Hollywood Bowl. Toquei lá algumas vezes com o Rush ao longo dos anos, era oportuno - mas, dessa vez, estava lá com minha esposa Carrie e com minha filha de seis anos Olivia para ver o Psychedelic Furs e o B-52s.
Eu adorava ao Furs nos anos 80, e o álbum solo de Richard Butler nos anos 2000 foi um dos meus favoritos por quase dois anos. Ele e suas canções ainda soavam ótimas. O B-52s não é nada senão divertido, claro, e por toda sua infância, Olivia dançava freneticamente com "Love Shack". Vê-la dançar (freneticamente) no corredor do Hollywood Bowl com a mãe era algo como dizem: "não tem preço".
Ultimamente, Olivia tem me apresentado aos seus amiguinhos da escola como 'Meu pai - ele é um baterista aposentado'. Verdadeiro de se dizer e engraçado de se ouvir. No Bowl, dois bateristas excelentes atraíram a apreciação profissional (aposentada) do papai: Paul Garisto cravando um equilíbrio perfeito de uma condução agressiva e astuta para os Furs e Sterling Campbell, estabelecendo um poderoso e sólido groove para o B-52s - maravilhosamente auxiliado pelo baixo muscular e imaculado de Tracy Wormworth.
Em seguida, tivemos a Orquestra do Hollywood Bowl e o final com fogos de artifício para coroar uma noite inesquecível em família. A ocasião se sentia "bem celebrada".
Aquela noite de 12 de setembro de 2015, que também era meu sexagésimo terceiro aniversário, não foi coincidência. Foi no meu aniversário de treze anos que meus pais me presentearam com aulas de bateria. Você sabe, sem bateria, apenas um par de baquetas e um pad de treino. Todo sábado de manhã, eu pegava o ônibus em direção ao centro de St. Catharines (Ontário) para ter aulas com Don George no Peninsula Conservatory of Music na St. Paul Street.
Mesmo lá eu não tocava bateria, pois outros instrumentos eram ensinados em salas vizinhas. Uma estrutura de pads com aros de metal imitava o layout de um conjunto de quatro peças, com um pedal de bumbo, chimbal e condução envolta por uma "meia". Aprendi meus rudimentos, as primeiras leituras elementares e padrões básicos naquelas peças, através de uma combinação de golpes e cliques. Ainda consigo ouvir aquele som. (Uma vez, Don me pediu para improvisar um pouco naquele set e, depois de tudo que fiz, ele balançou a cabeça e disse, "Legal. Alguns toques não teriam soado tão bem em uma bateria real, mas o espírito foi bom").
Don me deu meu primeiro e mais importante incentivo, mencionando também meu amigo Kit Jarvis. "De todos os meus alunos, você e Kit são os únicos que podem ser bateristas se quiserem". Isso significou muito.
Quanto a não tocar em uma bateria real naquele primeiro ano, felizmente sempre tive uma boa imaginação! Arrumaria revistas na minha cama na disposição da bateria de Gene Krupa, ou mais tarde na de Keith Moon e tocaria nas capas das mesmas. Sentaria de frente para o espelho e levantaria minhas baquetas - como o louco no qual sonhava me tornar.
Minha mãe e meu pai me disseram que, se eu me dedicasse às aulas e praticasse por um ano, eles iriam pensar em comprar uma bateria para mim. Claro o suficiente - no ano seguinte, eles compraram um set Stewart de três peças (150 dólares) em vermelho brilhante, bumbo, caixa, um tom e um pequeno prato (de som metálico).
Naquele primeiro dia, minhas brilhantes joias vermelhas foram arrumadas na sala de estar, e eu tocava cada vez mais orgulhoso minhas canções "Wipeout" e "Land of a Thousand Dances" (uma banda local fez um cover dessa com uma bateria bem legal). Em seguida, subi peça por peça para o meu quarto no andar superior, e todas as tardes após a escola tocava junto com um rádio rosa AM, colocado em cima do radiador de vapor ao meu lado. Tentava tocar junto com qualquer canção que entrasse no Top 40 da estação.
Em seguida, minha mãe e meu pai me deram um chimbal e depois um surdo, e eu economizei dinheiro entregando jornais e aparando gramados por um par de pratos Ajax. Continuava ainda tocando com os hits das rádios de 1965 e 1966. (Momento perfeito para citar aqui um baterista contemporâneo que comentou aquela época, "Meus seis bateristas favoritos eram Hal Blaine!").
Foi aí que comecei, há cinquenta anos, a jornada que tem sido.
Quarenta e um anos com uma banda - três rapazes que cresceram juntos na música e na vida, passando por tudo que a música e a vida podem jogar em você. Por todo o tempo, estávamos fazendo o que queríamos e da forma que queríamos.
Essa é a qualidade com a qual verdadeiramente mais me orgulho - que podemos ficar como exemplos em face do que muitas vezes parece ser uma máquina de entretenimento corporativo. Se nada mais, mostramos que é possível fazer uma carreira na música sem entregar - ou vender - a alma. Você só precisa ser determinado e, claro, ter sorte.
Não consigo dar a declaração "não mudaria nada" que às vezes ouvimos por aí, pois há elementos na música e na vida que eu queria que tivessem sido melhores. Uma linha em nossa canção "Headlong Flight" foi inspirada no meu professor de bateria, Freddie Gruber, "Queria poder viver tudo de novo". Perto do fim da longa e movimentada vida de Freddie, ele afirmava que queria ter cada experiência e cada sensação novamente, exatamente como aconteceram. Algumas pessoas veem justamente a outra interpretação que utilizei nessa frase - um desejo de querer fazer tudo de novo, mas melhor. Mas não importa - arrependimentos, em última análise, não ajudam.
O terceiro professor da minha Santíssima Trindade, Peter Erskine, moldou uma forma de olhar para o seu "eu" jovem com uma tolerância divertida no estilo Buda. Ele falava confortavelmente e com um sorriso sobre a maneira impensada na qual costumava dispor sua bateria, ou sobre o quão limitada era sua forma de tocar em alguma técnica. Se ele foi falho e tolo sendo melhor agora, isso é tudo o que importa.
Foi Peter que me ajudou a conquistar - ou pelo menos a atacar - o que pra mim foi a fronteira final: a improvisação. Tendo desenvolvido uma certa quantidade de ferramentas de composição e hábitos ao longo de mais de quarenta anos tocando, eu estava determinado a me tornar mais livre e espontâneo. Peter me ajudou a atingir esse objetivo com orientações sobre o desenvolvimento mais profundo na sensação de tempo e numa maior musicalidade. (Com crédito para Nick "Booujzhe" Raskulinecz também, que me encorajou e ativou meu improviso no estúdio).
Agora, após cinquenta anos na devoção de bater em coisas com baquetas, sinto-me orgulhoso, grato e satisfeito. A realidade é que minha forma de tocar bateria é, em grande parte, um compromisso atlético, e não me traz dor perceber que, como todos os outros atletas, chega a hora de sair do jogo. Prefiro muito mais colocar de lado e enfrentar a situação descrita em nossa canção "Losing It" (canção de 1982 que foi tocada ao vivo pela primeira vez na turnê de quadragésimo aniversário, R40, em 2015). Nos dois versos da mesma, temos uma bailarina que envelhece e um escritor que enfrenta o enfraquecimento, talentos crepusculares com dor e desespero, ("Mais triste ainda ver morrer do que nunca ter conhecido").
Acho que você tem que saber quando está no topo da sua montanha particular. Talvez não no cume, porém o mais alto que você possa ir. Penso numa citação de Buddy Rich que usei no meu livro Roadshow sobre nossa turnê R30, há dez longos anos: "No final da vida, Buddy Rich foi perguntado se ele se considerava o melhor baterista do mundo, dando uma resposta inspiradora: 'Vamos colocar dessa forma: eu tenho essa ambição. Você nunca alcança de fato a grandeza. Você alcança uma certa quantidade de mansidão e, se você for realmente sério com sua mansidão, continuará tentando ser grande. Nunca cheguei a um ponto em minha carreira onde estivesse totalmente satisfeito com qualquer coisa que tivesse feito, mas continuarei tentando".
Recentemente peguei outra grande citação, essa de Artie Shaw. Como muitos leitores vão saber, ele era um célebre líder de big-band e clarinetista (ele considerava Benny Goodman como "a concorrência"), ficando famoso em desistir de tocar aos quarenta e quatro anos. A soma de sua carreira realmente ressoa comigo agora. "Tinha que ser melhor, melhor e melhor. Sempre pude ser melhor. Quando parei, era porque não podia mais fazer melhor".
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"Não há nada pra dizer", diz Geddy. "Acho que Neil está explicando suas razões em não querer mais fazer turnês, pois seu corpo está pagando o preço. Isso é tudo que tenho para dizer sobre o assunto. Por fim, vamos nos encontrar e conversar sobre as coisas. Mas, na minha opinião, não há nada realmente surpreendente no que ele disse. Aparentemente, Neil só sente que tem que se explicar para todas as milhares de pessoas que perguntam, 'Porque não fazer mais turnês?'. Ele precisa explicar seu lado".
Perguntado se sente que a declaração de Peart foi divulgada fora do contexto, Lee acrescenta: "Com certeza sim. É o trabalho deles - falar sobre algo quando não há nada para falar".
O diretor geral da Ole, Andy Curran, empresa canadense que acabou de adquirir as operações da Anthem/SRO Entertainment (estas que gerenciaram por décadas os negócios do Rush), ofereceu durante a semana uma curta e importante declaração sobre os planos futuros do Rush. "Até onde eu sei é apenas um rumor", respondendo ao jornal Toronto Star e a outros veículos de comunicação. Curran confirmou que a banda teria o compromisso de lançamento de um DVD ao vivo da R40 (liberado em novembro) e, pelo menos, mais um projeto de estúdio.
Com todas essas importantes atualizações (que podem ajudar na melhor compreensão de todo o cenário), oferecemos o ensaio completo de Peart para a Drumhead, inteiramente traduzido para o Rush Fã-Clube Brasil.
NEIL PEART REFLETE SOBRE SEUS 50 ANOS BATENDO EM COISAS COM BAQUETAS
Drumhead Magazine / Novembro e Dezembro de 2015 - Por Neil Peart
Não sendo alguém para celebrar "ocasiões" pessoais, fico sempre contente e tranquilo em assinalar marcos como aniversários em particular. Não que eu os negue - em cada setembro, fico orgulhoso e grato por ter sobrevivido mais um ano e, ultimamente, aos sessenta e três anos de idade, por estar na minha sétima década. Não gosto de fazer muito barulho ou de lidar com isso como uma grande coisa.
Por essa razão, foi em alguns dias depois que percebi que havia passado por meu quinquagésimo aniversário tocando bateria - em um show no Hollywood Bowl. Toquei lá algumas vezes com o Rush ao longo dos anos, era oportuno - mas, dessa vez, estava lá com minha esposa Carrie e com minha filha de seis anos Olivia para ver o Psychedelic Furs e o B-52s.
Eu adorava ao Furs nos anos 80, e o álbum solo de Richard Butler nos anos 2000 foi um dos meus favoritos por quase dois anos. Ele e suas canções ainda soavam ótimas. O B-52s não é nada senão divertido, claro, e por toda sua infância, Olivia dançava freneticamente com "Love Shack". Vê-la dançar (freneticamente) no corredor do Hollywood Bowl com a mãe era algo como dizem: "não tem preço".
Ultimamente, Olivia tem me apresentado aos seus amiguinhos da escola como 'Meu pai - ele é um baterista aposentado'. Verdadeiro de se dizer e engraçado de se ouvir. No Bowl, dois bateristas excelentes atraíram a apreciação profissional (aposentada) do papai: Paul Garisto cravando um equilíbrio perfeito de uma condução agressiva e astuta para os Furs e Sterling Campbell, estabelecendo um poderoso e sólido groove para o B-52s - maravilhosamente auxiliado pelo baixo muscular e imaculado de Tracy Wormworth.
Em seguida, tivemos a Orquestra do Hollywood Bowl e o final com fogos de artifício para coroar uma noite inesquecível em família. A ocasião se sentia "bem celebrada".
Aquela noite de 12 de setembro de 2015, que também era meu sexagésimo terceiro aniversário, não foi coincidência. Foi no meu aniversário de treze anos que meus pais me presentearam com aulas de bateria. Você sabe, sem bateria, apenas um par de baquetas e um pad de treino. Todo sábado de manhã, eu pegava o ônibus em direção ao centro de St. Catharines (Ontário) para ter aulas com Don George no Peninsula Conservatory of Music na St. Paul Street.
Mesmo lá eu não tocava bateria, pois outros instrumentos eram ensinados em salas vizinhas. Uma estrutura de pads com aros de metal imitava o layout de um conjunto de quatro peças, com um pedal de bumbo, chimbal e condução envolta por uma "meia". Aprendi meus rudimentos, as primeiras leituras elementares e padrões básicos naquelas peças, através de uma combinação de golpes e cliques. Ainda consigo ouvir aquele som. (Uma vez, Don me pediu para improvisar um pouco naquele set e, depois de tudo que fiz, ele balançou a cabeça e disse, "Legal. Alguns toques não teriam soado tão bem em uma bateria real, mas o espírito foi bom").
Don me deu meu primeiro e mais importante incentivo, mencionando também meu amigo Kit Jarvis. "De todos os meus alunos, você e Kit são os únicos que podem ser bateristas se quiserem". Isso significou muito.
Quanto a não tocar em uma bateria real naquele primeiro ano, felizmente sempre tive uma boa imaginação! Arrumaria revistas na minha cama na disposição da bateria de Gene Krupa, ou mais tarde na de Keith Moon e tocaria nas capas das mesmas. Sentaria de frente para o espelho e levantaria minhas baquetas - como o louco no qual sonhava me tornar.
Minha mãe e meu pai me disseram que, se eu me dedicasse às aulas e praticasse por um ano, eles iriam pensar em comprar uma bateria para mim. Claro o suficiente - no ano seguinte, eles compraram um set Stewart de três peças (150 dólares) em vermelho brilhante, bumbo, caixa, um tom e um pequeno prato (de som metálico).
Naquele primeiro dia, minhas brilhantes joias vermelhas foram arrumadas na sala de estar, e eu tocava cada vez mais orgulhoso minhas canções "Wipeout" e "Land of a Thousand Dances" (uma banda local fez um cover dessa com uma bateria bem legal). Em seguida, subi peça por peça para o meu quarto no andar superior, e todas as tardes após a escola tocava junto com um rádio rosa AM, colocado em cima do radiador de vapor ao meu lado. Tentava tocar junto com qualquer canção que entrasse no Top 40 da estação.
Em seguida, minha mãe e meu pai me deram um chimbal e depois um surdo, e eu economizei dinheiro entregando jornais e aparando gramados por um par de pratos Ajax. Continuava ainda tocando com os hits das rádios de 1965 e 1966. (Momento perfeito para citar aqui um baterista contemporâneo que comentou aquela época, "Meus seis bateristas favoritos eram Hal Blaine!").
Foi aí que comecei, há cinquenta anos, a jornada que tem sido.
Quarenta e um anos com uma banda - três rapazes que cresceram juntos na música e na vida, passando por tudo que a música e a vida podem jogar em você. Por todo o tempo, estávamos fazendo o que queríamos e da forma que queríamos.
Essa é a qualidade com a qual verdadeiramente mais me orgulho - que podemos ficar como exemplos em face do que muitas vezes parece ser uma máquina de entretenimento corporativo. Se nada mais, mostramos que é possível fazer uma carreira na música sem entregar - ou vender - a alma. Você só precisa ser determinado e, claro, ter sorte.
Não consigo dar a declaração "não mudaria nada" que às vezes ouvimos por aí, pois há elementos na música e na vida que eu queria que tivessem sido melhores. Uma linha em nossa canção "Headlong Flight" foi inspirada no meu professor de bateria, Freddie Gruber, "Queria poder viver tudo de novo". Perto do fim da longa e movimentada vida de Freddie, ele afirmava que queria ter cada experiência e cada sensação novamente, exatamente como aconteceram. Algumas pessoas veem justamente a outra interpretação que utilizei nessa frase - um desejo de querer fazer tudo de novo, mas melhor. Mas não importa - arrependimentos, em última análise, não ajudam.
O terceiro professor da minha Santíssima Trindade, Peter Erskine, moldou uma forma de olhar para o seu "eu" jovem com uma tolerância divertida no estilo Buda. Ele falava confortavelmente e com um sorriso sobre a maneira impensada na qual costumava dispor sua bateria, ou sobre o quão limitada era sua forma de tocar em alguma técnica. Se ele foi falho e tolo sendo melhor agora, isso é tudo o que importa.
Foi Peter que me ajudou a conquistar - ou pelo menos a atacar - o que pra mim foi a fronteira final: a improvisação. Tendo desenvolvido uma certa quantidade de ferramentas de composição e hábitos ao longo de mais de quarenta anos tocando, eu estava determinado a me tornar mais livre e espontâneo. Peter me ajudou a atingir esse objetivo com orientações sobre o desenvolvimento mais profundo na sensação de tempo e numa maior musicalidade. (Com crédito para Nick "Booujzhe" Raskulinecz também, que me encorajou e ativou meu improviso no estúdio).
Agora, após cinquenta anos na devoção de bater em coisas com baquetas, sinto-me orgulhoso, grato e satisfeito. A realidade é que minha forma de tocar bateria é, em grande parte, um compromisso atlético, e não me traz dor perceber que, como todos os outros atletas, chega a hora de sair do jogo. Prefiro muito mais colocar de lado e enfrentar a situação descrita em nossa canção "Losing It" (canção de 1982 que foi tocada ao vivo pela primeira vez na turnê de quadragésimo aniversário, R40, em 2015). Nos dois versos da mesma, temos uma bailarina que envelhece e um escritor que enfrenta o enfraquecimento, talentos crepusculares com dor e desespero, ("Mais triste ainda ver morrer do que nunca ter conhecido").
Acho que você tem que saber quando está no topo da sua montanha particular. Talvez não no cume, porém o mais alto que você possa ir. Penso numa citação de Buddy Rich que usei no meu livro Roadshow sobre nossa turnê R30, há dez longos anos: "No final da vida, Buddy Rich foi perguntado se ele se considerava o melhor baterista do mundo, dando uma resposta inspiradora: 'Vamos colocar dessa forma: eu tenho essa ambição. Você nunca alcança de fato a grandeza. Você alcança uma certa quantidade de mansidão e, se você for realmente sério com sua mansidão, continuará tentando ser grande. Nunca cheguei a um ponto em minha carreira onde estivesse totalmente satisfeito com qualquer coisa que tivesse feito, mas continuarei tentando".
Recentemente peguei outra grande citação, essa de Artie Shaw. Como muitos leitores vão saber, ele era um célebre líder de big-band e clarinetista (ele considerava Benny Goodman como "a concorrência"), ficando famoso em desistir de tocar aos quarenta e quatro anos. A soma de sua carreira realmente ressoa comigo agora. "Tinha que ser melhor, melhor e melhor. Sempre pude ser melhor. Quando parei, era porque não podia mais fazer melhor".
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