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THE COLOR OF RIGHT TIME AND MOTION TOTEM
TIME AND MOTION
Time and motion
Wind and sun and rain
Days connect like boxcars in a train
Fill them up with precious cargo
Squeeze in all that you can find
Spontaneous elation
And the long-enduring kind
Time and motion
Flesh and blood and fire
Lives connect in webs of gold and razor wire
Spin a thread of precious contact
Squeeze in all that you can find
Spontaneous relations
And the long-enduring kind
The mighty ocean
Dances with the moon
The silent forest
Echoes with the loon
Time and motion
Live and love and dream
Eyes connect like interstellar beams
Superman in Supernature
Needs all the comfort he can find
Spontaneous emotion
And the long enduring kind
Time and motion
Wind and sun and rain
Days connect like boxcars in a train
Fill them up with precious cargo
Squeeze in all that you can find
Spontaneous elation
And the long-enduring kind
Time and motion
Flesh and blood and fire
Lives connect in webs of gold and razor wire
Spin a thread of precious contact
Squeeze in all that you can find
Spontaneous relations
And the long-enduring kind
The mighty ocean
Dances with the moon
The silent forest
Echoes with the loon
Time and motion
Live and love and dream
Eyes connect like interstellar beams
Superman in Supernature
Needs all the comfort he can find
Spontaneous emotion
And the long enduring kind
TEMPO E MOVIMENTO
Tempo e movimento
Vento e sol e chuva
Dias se conectam como vagões em um comboio
Encha-os com carga preciosa
Comprima com tudo que você puder encontrar
Alegria espontânea
E a do tipo duradoura
Tempo e movimento
Carne e sangue e fogo
Vidas se conectam em teias de ouro e arame farpado
Teça um fio de contato precioso
Comprima com tudo que você puder encontrar
Relações espontâneas
E as do tipo duradouras
O grande oceano
Dança com a lua
A floresta silenciosa
Ecoa com o mergulhão
Tempo e movimento
Viva e ame e sonhe
Olhos se conectam como feixes interestelares
Super Homem na Super Natureza
Precisa de todo o conforto que puder encontrar
Emoção espontânea
E a do tipo duradoura
Tempo e movimento
Vento e sol e chuva
Dias se conectam como vagões em um comboio
Encha-os com carga preciosa
Comprima com tudo que você puder encontrar
Alegria espontânea
E a do tipo duradoura
Tempo e movimento
Carne e sangue e fogo
Vidas se conectam em teias de ouro e arame farpado
Teça um fio de contato precioso
Comprima com tudo que você puder encontrar
Relações espontâneas
E as do tipo duradouras
O grande oceano
Dança com a lua
A floresta silenciosa
Ecoa com o mergulhão
Tempo e movimento
Viva e ame e sonhe
Olhos se conectam como feixes interestelares
Super Homem na Super Natureza
Precisa de todo o conforto que puder encontrar
Emoção espontânea
E a do tipo duradoura
A existência e suas partes elementares
A complexa "Time And Motion" é a quinta faixa de Test For Echo. Retomando a obscuridade característica das duas canções iniciais, continuamos com o Rush exibindo toda sua mágica habilidade e incrível escolha de elementos, dessa vez se debruçando em uma elaboração essencialmente progressiva e impetuosa.
Caótica, sombria, intrincada e até mesmo bizarra, "Time And Motion" pode ser definida como uma das criações mais enigmáticas em toda carreira da banda, tanto musicalmente quanto liricamente. Extremamente técnica e com fortes influências do metal, a composição exprime com grande destaque o talento matemático tradicional dos três integrantes. Arranjos espetaculares e variações de compasso soando como triviais são marcantes, e a centralidade recai novamente sobre os riffs admiráveis e onipresentes de Alex Lifeson.
Partindo de uma interessante introdução polirrítmica, somos contemplados com uma repentina proeminência de sintetizadores, estes que efetivam um chocante contraponto com as paredes de guitarra e linhas de baixo no forçar de um avanço mais melódico. Todo o aparato rende o equilíbrio perfeito entre agressividade e leveza, acurados pelos preenchimentos infalíveis de Neil Peart e por uma cuidadosa hostilidade vocal oferecida por Geddy Lee. A construção ainda reserva um solo caótico e excepcional de Lifeson que, associado a todo turbilhão musical, intensifica os trancos de uma viagem para locais escuros e misteriosos.
"Time And Motion começou pela letra, com a música chegando muito rapidamente", explica Geddy. "A primeira frase musical foi consolidada pelo sentimento que as palavras trouxeram para nós. Posteriormente, achei que seria útil dramatizar um pouco - assim, decidimos introduzir alguns acordes maiores. Essa canção poderia ser chamada de rejeitada; a primeira versão foi criada há alguns anos, mas jamais utilizada. Por fim, se deu de uma forma um tanto quanto diferente e, na minha opinião, mais interessante. É uma das minhas favoritas no álbum".
"É do tipo que vai e vem ao longo de várias formas de compasso", explica Lifeson. "Se ela se chama 'Time and Motion', é porque estou a ponto de explodir por lá", brinca o guitarrista.
Ecoando ideias liricas de canções do álbum Hold Your Fire (1987), como "Time Stand Still" e "Turn The Page", "Time and Motion" preconiza todos os traços das produções de Neil Peart: a reflexão sobre a passagem do tempo como o elemento mais fundamental para nossa vivência. A observância da explosão emocional em flashes momentâneos e a busca por experiências sólidas e duradouras resumem o cerne da composição.
"Tudo começou a partir de uma pequena semente", explica Peart. "Certa vez, um amigo meu observou de forma improvisada que a vida não deveria ser resumida pelas coisas que oferece, mas por aquilo que podemos extrair dela. E eu pensei no quão profundo e perspicaz era isso, desenvolvendo a metáfora dos vagões de um trem, definindo nós mesmos como os responsáveis por carregar toda a carga. Esse trem não chega à estação repleto de coisas; somos nós que devemos abastecê-lo. Trata-se de um dos meus temas costumeiros, visitando a autodeterminação e força de vontade, estes que não esperam as coisas acontecerem. Você deve ir até lá para fazer com que aconteçam".
"Carpe Diem - sim, aproveite o dia. Penso no aqui e agora, na preciosidade do tempo na sua excelência, além de sua transitoriedade, claro. Tudo veio de pequenas observações".
Peart concentra-se em "Time And Motion" ligando temporalidades de curto e longo prazo à três pilares centrais: alegria, relações e emoções. No primeiro verso, seguindo a já mencionada metáfora dos vagões de um trem, o letrista concatena poeticamente elementos da natureza (vento, sol e chuva) à própria dinâmica inexorável do tempo, relacionando os mesmos às alegrias do cotidiano à imprevisibilidade natural. O vento pode soprar agradável como uma brisa refrescante, mas também prenunciar uma terrível tempestade. O sol pode brilhar nos mantendo aquecidos e felizes, mas pode trazer também o desconforto nos dias (ou em locais) mais quentes. A chuva, por sua vez, pode representar um alívio após uma onda de calor, mas também nos forçar reclusão ou ocasionar destruição quando mais intensa. Dessa forma, a alegria espontânea, explosiva e arrebatadora, situa-se no trecho da canção ao lado da imprevisibilidade e do sentimento duradouro, contrapondo os momentos temporários de bem-estar.
O terceiro e quarto versos observam as relações humanas, indicando o entrelace das palavras carne, sangue e fogo. As duas primeiras refletem uma metáfora muito comum para designar o ser humano, e o fogo, grande símbolo literário, pode referir-se às explosões de emoção que sentimos, os desafios enfrentados ou até mesmo os sentimentos acalorados ou apaixonados como fúria e raiva. O letrista também considera a vida como uma grande e variada coleção de relações entre as pessoas - às vezes ligadas por ouro (grande símbolo de preciosidade) ou arame farpado (utilizado para manter os indesejáveis afastados), destacando também os envolvimentos duradouros como fundamentais e valiosos.
"A frase 'Spontaneous relations and the long enduring kind' ['Relações espontâneas e as do tipo duradouras'] refere-se a algo tão simples quanto compartilhar um sorriso com alguém na rua, ou ao acenarmos para uma criança", explica o letrista. "Esses são pequenos grandes momentos que podem trazer um sorriso para seu rosto. (...) Os do 'tipo duradouro' são relacionamentos que você deve cultivar ao longo do tempo, sejam pessoais ou profissionais. Eles demandam trabalho e esforço, e precisam de manutenção. Na canção 'Ghost of a Chance' [de Roll The Bones, 1991], tentei deixar isso claro com as palavras cuidadosamente escolhidas no trecho 'We can find someone to love, and make it last' ['Podemos encontrar alguém para amar e fazer durar']. (…) De qualquer forma, casamentos e amizades fortes são relacionamentos do tipo duradouros".
Sem dúvidas, a frase pode indicar o próprio Rush: uma banda que sempre soube trabalhar como um projeto duradouro, consistente e ao mesmo tempo espontâneo, tendo em vista suas várias e inesgotáveis reinvenções. "Posso pensar nisso sobre a minha própria forma de tocar bateria, na qual há uma longa agenda sobre praticar e melhorar. Mas, ao mesmo tempo, tento mantê-la espontânea. Não há nada que adoro mais do que apenas ir para o porão e tocar, apenas para que as coisas aconteçam. O mesmo nos termos de gravação - sempre tenho o cuidado de manter uma janela de espontaneidade, deixando de ensaiar todos os aspectos da minha performance".
"É sempre estimulante, mas um pouco perigoso também. Acho que é muito importante não saber exatamente o que vai acontecer, seja para uma transição em particular ou para um preenchimento com um tambor".
"Sempre vou trabalhar as linhas de bateria de forma completa, orquestrando-as com bastante cuidado, mas deixando uma área onde posso ser espontâneo. Novamente, a pressão irá me levar à um nível mais elevado, permitindo que esses momentos sejam diferentes do que teriam sido - espero que melhores. Assim, tocar bateria é como a vida - olhe para isso como a forma que você leva a vida, seus relacionamentos e suas relações com o Universo. A vida é cheia desses momentos - na verdade, um acúmulo de momentos - e é preciso lidar com a espontaneidade. Como eu digo em 'Time and Motion', nós 'tecemos um fio de contato precioso' com outros em nossa jornada, e esses relacionamentos acrescentam ao estado de fluxo. Mais uma vez, é a viagem que conta, e a viagem continua para sempre".
Amoldado por um pequeno e intermitente abrandamento instrumental, o letrista reserva para o quinto verso elementos figurativos que reforçam os relacionamentos como os responsáveis pelo movimento da vida. No primeiro instante, há uma menção poética sobre a superfície oceânica sendo afetada pela gravidade lunar, principal fenômeno natural que ocasiona as marés. No segundo momento, temos a descrição da interrupção do silêncio de uma floresta a partir do canto de um mergulhão-do-norte (loon), pequeno pássaro aquático muito comum no Canadá e que inclusive é retratado na moeda de um dólar do país. Os mergulhões-do-norte produzem sons impressionantes e assustadores, que podem ser ouvidos à quilômetros de distância. Com essas figuras, Peart afirma que a dinâmica da vida é interligada pela relação de peças menores e maiores, pensando também sobre os pequenos e vários momentos que formam um todo duradouro.
Por fim, há uma interessante referência à filosofia no verso de fechamento da canção. No último verso, Peart traz o conceito do super-homem (Übermensch) idealizado pelo filósofo alemão Friedrich Nietzsche (1844 - 1900), descrito no livro Assim Falou Zaratustra, concebido entre 1883 e 1885. Para Nietzsche, o super-homem é o indivíduo que criou seus próprios valores afirmativos de vida, não sendo condicionado pelos hábitos e diretrizes sociais de uma época. Trata-se do tipo superior de homem que conseguiu superar todos os valores - aquele que supera ilusões e que se volta para a Terra, dando valor à vida terrena com um novo modo de sentir, pensar e avaliar (uma nova forma de existir como sujeito). Ou seja, o super-homem adquire uma nova subjetividade, na vivência conjunta do cotidiano.
O letrista, que escreveu com spray a frase Deus Está Morto na parede do seu quarto quando adolescente, utiliza essa figura de Nietzsche para ratificar a primordialidade do tempo no desenvolvimento e adequação da humanidade à poderosa natureza. Além disso, ele relativiza a temporalidade das emoções: mesmo fortes e inclinados à impulsividade emocional, o ser humano necessita do conforto de sensações perenes.
"Essa canção reponde à natureza e ao tempo, coisas fundamentais para mim, e ao culto da beleza essencial e dos fenômenos naturais numa base do dia a dia", explica Peart. "Em toda nossa história como espécies, nada foi mais importante, mais fundamental para nós e para nossos meios de subsistência que o tempo. Nossas esperanças para o próximo inverno, nossa sobrevivência para o próximo verão... tudo isso foi inteiramente baseado no tempo e gerações e, inevitavelmente, tornou-se a coisa mais importante do mundo para o homem".
"Time and Motion" discute o tempo que afeta diretamente a humanidade e toda dinâmica da vida e do planeta. Sua percepção sensorial pode ser revestida de lentidão ou agilidade, com momentos se tornando horas e dias minutos, e seu curso impossível de ser paralisado. Peart visita elementos como a espontaneidade (o imediato, o calor do momento, coisas realizadas muitas vezes sem análises prévias), a euforia (alegria, prazer ou felicidade súbita e inesperada), as relações (necessidade de se aproximar de alguém de forma fugaz confrontada à convivência duradoura) e emoções (todo fluxo de sentimentos que na maioria das vezes age instantaneamente e instintivamente sobre nós). Porém, a grande maioria não almeja viver somente dos minutos de sensações súbitas, mas também de certezas, segurança e de sentimentos que trazem estabilidade.
© 2016 Rush Fã-Clube Brasil
A complexa "Time And Motion" é a quinta faixa de Test For Echo. Retomando a obscuridade característica das duas canções iniciais, continuamos com o Rush exibindo toda sua mágica habilidade e incrível escolha de elementos, dessa vez se debruçando em uma elaboração essencialmente progressiva e impetuosa.
Caótica, sombria, intrincada e até mesmo bizarra, "Time And Motion" pode ser definida como uma das criações mais enigmáticas em toda carreira da banda, tanto musicalmente quanto liricamente. Extremamente técnica e com fortes influências do metal, a composição exprime com grande destaque o talento matemático tradicional dos três integrantes. Arranjos espetaculares e variações de compasso soando como triviais são marcantes, e a centralidade recai novamente sobre os riffs admiráveis e onipresentes de Alex Lifeson.
Partindo de uma interessante introdução polirrítmica, somos contemplados com uma repentina proeminência de sintetizadores, estes que efetivam um chocante contraponto com as paredes de guitarra e linhas de baixo no forçar de um avanço mais melódico. Todo o aparato rende o equilíbrio perfeito entre agressividade e leveza, acurados pelos preenchimentos infalíveis de Neil Peart e por uma cuidadosa hostilidade vocal oferecida por Geddy Lee. A construção ainda reserva um solo caótico e excepcional de Lifeson que, associado a todo turbilhão musical, intensifica os trancos de uma viagem para locais escuros e misteriosos.
"Time And Motion começou pela letra, com a música chegando muito rapidamente", explica Geddy. "A primeira frase musical foi consolidada pelo sentimento que as palavras trouxeram para nós. Posteriormente, achei que seria útil dramatizar um pouco - assim, decidimos introduzir alguns acordes maiores. Essa canção poderia ser chamada de rejeitada; a primeira versão foi criada há alguns anos, mas jamais utilizada. Por fim, se deu de uma forma um tanto quanto diferente e, na minha opinião, mais interessante. É uma das minhas favoritas no álbum".
"É do tipo que vai e vem ao longo de várias formas de compasso", explica Lifeson. "Se ela se chama 'Time and Motion', é porque estou a ponto de explodir por lá", brinca o guitarrista.
Ecoando ideias liricas de canções do álbum Hold Your Fire (1987), como "Time Stand Still" e "Turn The Page", "Time and Motion" preconiza todos os traços das produções de Neil Peart: a reflexão sobre a passagem do tempo como o elemento mais fundamental para nossa vivência. A observância da explosão emocional em flashes momentâneos e a busca por experiências sólidas e duradouras resumem o cerne da composição.
"Tudo começou a partir de uma pequena semente", explica Peart. "Certa vez, um amigo meu observou de forma improvisada que a vida não deveria ser resumida pelas coisas que oferece, mas por aquilo que podemos extrair dela. E eu pensei no quão profundo e perspicaz era isso, desenvolvendo a metáfora dos vagões de um trem, definindo nós mesmos como os responsáveis por carregar toda a carga. Esse trem não chega à estação repleto de coisas; somos nós que devemos abastecê-lo. Trata-se de um dos meus temas costumeiros, visitando a autodeterminação e força de vontade, estes que não esperam as coisas acontecerem. Você deve ir até lá para fazer com que aconteçam".
"Carpe Diem - sim, aproveite o dia. Penso no aqui e agora, na preciosidade do tempo na sua excelência, além de sua transitoriedade, claro. Tudo veio de pequenas observações".
Peart concentra-se em "Time And Motion" ligando temporalidades de curto e longo prazo à três pilares centrais: alegria, relações e emoções. No primeiro verso, seguindo a já mencionada metáfora dos vagões de um trem, o letrista concatena poeticamente elementos da natureza (vento, sol e chuva) à própria dinâmica inexorável do tempo, relacionando os mesmos às alegrias do cotidiano à imprevisibilidade natural. O vento pode soprar agradável como uma brisa refrescante, mas também prenunciar uma terrível tempestade. O sol pode brilhar nos mantendo aquecidos e felizes, mas pode trazer também o desconforto nos dias (ou em locais) mais quentes. A chuva, por sua vez, pode representar um alívio após uma onda de calor, mas também nos forçar reclusão ou ocasionar destruição quando mais intensa. Dessa forma, a alegria espontânea, explosiva e arrebatadora, situa-se no trecho da canção ao lado da imprevisibilidade e do sentimento duradouro, contrapondo os momentos temporários de bem-estar.
O terceiro e quarto versos observam as relações humanas, indicando o entrelace das palavras carne, sangue e fogo. As duas primeiras refletem uma metáfora muito comum para designar o ser humano, e o fogo, grande símbolo literário, pode referir-se às explosões de emoção que sentimos, os desafios enfrentados ou até mesmo os sentimentos acalorados ou apaixonados como fúria e raiva. O letrista também considera a vida como uma grande e variada coleção de relações entre as pessoas - às vezes ligadas por ouro (grande símbolo de preciosidade) ou arame farpado (utilizado para manter os indesejáveis afastados), destacando também os envolvimentos duradouros como fundamentais e valiosos.
"A frase 'Spontaneous relations and the long enduring kind' ['Relações espontâneas e as do tipo duradouras'] refere-se a algo tão simples quanto compartilhar um sorriso com alguém na rua, ou ao acenarmos para uma criança", explica o letrista. "Esses são pequenos grandes momentos que podem trazer um sorriso para seu rosto. (...) Os do 'tipo duradouro' são relacionamentos que você deve cultivar ao longo do tempo, sejam pessoais ou profissionais. Eles demandam trabalho e esforço, e precisam de manutenção. Na canção 'Ghost of a Chance' [de Roll The Bones, 1991], tentei deixar isso claro com as palavras cuidadosamente escolhidas no trecho 'We can find someone to love, and make it last' ['Podemos encontrar alguém para amar e fazer durar']. (…) De qualquer forma, casamentos e amizades fortes são relacionamentos do tipo duradouros".
Sem dúvidas, a frase pode indicar o próprio Rush: uma banda que sempre soube trabalhar como um projeto duradouro, consistente e ao mesmo tempo espontâneo, tendo em vista suas várias e inesgotáveis reinvenções. "Posso pensar nisso sobre a minha própria forma de tocar bateria, na qual há uma longa agenda sobre praticar e melhorar. Mas, ao mesmo tempo, tento mantê-la espontânea. Não há nada que adoro mais do que apenas ir para o porão e tocar, apenas para que as coisas aconteçam. O mesmo nos termos de gravação - sempre tenho o cuidado de manter uma janela de espontaneidade, deixando de ensaiar todos os aspectos da minha performance".
"É sempre estimulante, mas um pouco perigoso também. Acho que é muito importante não saber exatamente o que vai acontecer, seja para uma transição em particular ou para um preenchimento com um tambor".
"Sempre vou trabalhar as linhas de bateria de forma completa, orquestrando-as com bastante cuidado, mas deixando uma área onde posso ser espontâneo. Novamente, a pressão irá me levar à um nível mais elevado, permitindo que esses momentos sejam diferentes do que teriam sido - espero que melhores. Assim, tocar bateria é como a vida - olhe para isso como a forma que você leva a vida, seus relacionamentos e suas relações com o Universo. A vida é cheia desses momentos - na verdade, um acúmulo de momentos - e é preciso lidar com a espontaneidade. Como eu digo em 'Time and Motion', nós 'tecemos um fio de contato precioso' com outros em nossa jornada, e esses relacionamentos acrescentam ao estado de fluxo. Mais uma vez, é a viagem que conta, e a viagem continua para sempre".
Amoldado por um pequeno e intermitente abrandamento instrumental, o letrista reserva para o quinto verso elementos figurativos que reforçam os relacionamentos como os responsáveis pelo movimento da vida. No primeiro instante, há uma menção poética sobre a superfície oceânica sendo afetada pela gravidade lunar, principal fenômeno natural que ocasiona as marés. No segundo momento, temos a descrição da interrupção do silêncio de uma floresta a partir do canto de um mergulhão-do-norte (loon), pequeno pássaro aquático muito comum no Canadá e que inclusive é retratado na moeda de um dólar do país. Os mergulhões-do-norte produzem sons impressionantes e assustadores, que podem ser ouvidos à quilômetros de distância. Com essas figuras, Peart afirma que a dinâmica da vida é interligada pela relação de peças menores e maiores, pensando também sobre os pequenos e vários momentos que formam um todo duradouro.
Por fim, há uma interessante referência à filosofia no verso de fechamento da canção. No último verso, Peart traz o conceito do super-homem (Übermensch) idealizado pelo filósofo alemão Friedrich Nietzsche (1844 - 1900), descrito no livro Assim Falou Zaratustra, concebido entre 1883 e 1885. Para Nietzsche, o super-homem é o indivíduo que criou seus próprios valores afirmativos de vida, não sendo condicionado pelos hábitos e diretrizes sociais de uma época. Trata-se do tipo superior de homem que conseguiu superar todos os valores - aquele que supera ilusões e que se volta para a Terra, dando valor à vida terrena com um novo modo de sentir, pensar e avaliar (uma nova forma de existir como sujeito). Ou seja, o super-homem adquire uma nova subjetividade, na vivência conjunta do cotidiano.
O letrista, que escreveu com spray a frase Deus Está Morto na parede do seu quarto quando adolescente, utiliza essa figura de Nietzsche para ratificar a primordialidade do tempo no desenvolvimento e adequação da humanidade à poderosa natureza. Além disso, ele relativiza a temporalidade das emoções: mesmo fortes e inclinados à impulsividade emocional, o ser humano necessita do conforto de sensações perenes.
"Essa canção reponde à natureza e ao tempo, coisas fundamentais para mim, e ao culto da beleza essencial e dos fenômenos naturais numa base do dia a dia", explica Peart. "Em toda nossa história como espécies, nada foi mais importante, mais fundamental para nós e para nossos meios de subsistência que o tempo. Nossas esperanças para o próximo inverno, nossa sobrevivência para o próximo verão... tudo isso foi inteiramente baseado no tempo e gerações e, inevitavelmente, tornou-se a coisa mais importante do mundo para o homem".
"Time and Motion" discute o tempo que afeta diretamente a humanidade e toda dinâmica da vida e do planeta. Sua percepção sensorial pode ser revestida de lentidão ou agilidade, com momentos se tornando horas e dias minutos, e seu curso impossível de ser paralisado. Peart visita elementos como a espontaneidade (o imediato, o calor do momento, coisas realizadas muitas vezes sem análises prévias), a euforia (alegria, prazer ou felicidade súbita e inesperada), as relações (necessidade de se aproximar de alguém de forma fugaz confrontada à convivência duradoura) e emoções (todo fluxo de sentimentos que na maioria das vezes age instantaneamente e instintivamente sobre nós). Porém, a grande maioria não almeja viver somente dos minutos de sensações súbitas, mas também de certezas, segurança e de sentimentos que trazem estabilidade.
© 2016 Rush Fã-Clube Brasil
MIERS, J. "The Road Less Traveled / A Conversation With Neil Peart Of Rush". Weekend Music Editor, Buffalo New York's Metro Weekend. October 17 - 23, 1996.
MARSHALL, W. "Alex Lifeson: The Making Of A Guitar Legend". Guitar One Volume 5 Number 34. September/October 1996.
WEISS, W. "Rush - Moving Pictures / A Conversation With Geddy". Poland's Tylko Rock. November 1996.