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VIRTUALITY RESIST LIMBO
RESIST
I can learn to resist
Anything but temptation
I can learn to co-exist
With anything but pain
I can learn to compromise
Anything but my desires
I can learn to get along
With all the things I can't explain
I can learn to resist
Anything but frustration
I can learn to persist
With anything but aiming low
I can learn to close my eyes
To anything but injustice
I can learn to get along
With all the things I don't know
You can surrender
Without a prayer
But never really pray
Pray without surrender
You can fight
Without ever winning
But never ever win
Without a fight
I can learn to resist
Anything but temptation
I can learn to co-exist
With anything but pain
I can learn to compromise
Anything but my desires
I can learn to get along
With all the things I can't explain
I can learn to resist
Anything but frustration
I can learn to persist
With anything but aiming low
I can learn to close my eyes
To anything but injustice
I can learn to get along
With all the things I don't know
You can surrender
Without a prayer
But never really pray
Pray without surrender
You can fight
Without ever winning
But never ever win
Without a fight
RESISTA
Posso aprender resistir
A qualquer coisa, menos à tentação
Posso aprender coexistir
Com qualquer coisa, menos com a dor
Posso aprender me harmonizar
Com qualquer coisa, menos com meus desejos
Posso aprender a me dar bem
Com todas as coisas que não consigo explicar
Posso aprender resistir
A qualquer coisa, menos à frustração
Posso aprender persistir
Com qualquer coisa, menos pensar pequeno
Posso aprender fechar meus olhos
Para qualquer coisa, menos para a injustiça
Posso aprender a me dar bem
Com todas as coisas que não conheço
Você pode se entregar
Sem uma oração
Mas nunca ora de fato
Sem se entregar
Você pode lutar
Sem jamais vencer
Mas nunca, nunca vence
Sem uma luta
Posso aprender resistir
A qualquer coisa, menos à tentação
Posso aprender coexistir
Com qualquer coisa, menos com a dor
Posso aprender me harmonizar
Com qualquer coisa, menos com meus desejos
Posso aprender a me dar bem
Com todas as coisas que não consigo explicar
Posso aprender resistir
A qualquer coisa, menos à frustração
Posso aprender persistir
Com qualquer coisa, menos pensar pequeno
Posso aprender fechar meus olhos
Para qualquer coisa, menos para a injustiça
Posso aprender a me dar bem
Com todas as coisas que não conheço
Você pode se entregar
Sem uma oração
Mas nunca ora de fato
Sem se entregar
Você pode lutar
Sem jamais vencer
Mas nunca, nunca vence
Sem uma luta
Resista com seus ideais
Um novo momento para Test For Echo. Após a sequência de canções carregadas de obscuridade e peso no disco (porém atenuadas por doses melódicas sutis), a nona faixa é reservada à belíssima e tocante "Resist", uma balada comovente que integra certamente o rol das criações mais cativantes e inspiradoras de toda carreira do Rush. Retomando uma de suas mais fortes características líricas, a banda constrói com maestria outro exuberante hino ao otimismo, persistência, atitude e força humana, criando um paralelo com o reconhecimento profundo das limitações pessoais e aliceçando suas ideias numa composição musical doce e admirável.
Conforme as gradativas abordagens sobre o amor, o trio trilhou suas várias fases explorando a produção de canções mais calmas, com estas acontecendo cada vez mais poderosas e comoventes. Instantaneamente agradável, "Resist" consegue transmitir o talento dos músicos numa roupagem de grande sensibilidade e refinamento. Os vocais de Geddy Lee soam grandiosos, e talvez sua performance possa ser definida como uma das mais competentes capturas de percepções exigidas pelas letras da banda. Temos, portanto, uma joia absoluta, brilhante em todos os seus elementos.
"'Resist' é uma das melhores canções que já escrevemos", afima Geddy. "Sabia, desde o começo, que se tratava de algo muito especial para o Rush - só pelo tipo de energia que visitou a todos enquanto a escrevíamos e gravávamos".
Para a introdução de "Resist", Neil Peart utiliza um Dulcimer, instrumento de percussão medieval na forma de um trapézio, composto por uma caixa acústica de madeira com cordas metálicas de aço dispostas horizontalmente. O som é produzido quando as cordas são batidas por baquetas no formato de pequenos martelos, estes que produzem uma atmosfera vibrante, seca e metálica. O seguimento da canção mergulha numa base sensível de violões, aliados à finas camadas de baixo e vocais dobrados, elementos que evocam nuances do folk rock e que sempre atraem linhas de bateria de grande presença e esmero. Mesclando delicadeza e vigor, "Resist" oferece ainda elementos resplandecentes como guitarras celtas flutuantes e uma ponte solitária criada para uma das citações mais profundas de todo o disco. Finalmente, temos uma tocante divisão dos elementos acústicos entre os canais, com os pratos (acionados suavemente), carregando o cenário para uma explosão de overdubs, ações que eclodem efeitos primorosos e essenciais para a mensagem proposta.
"'Resist' é uma das minhas favoritas desde o começo, e uma das nossas melhores composições", afirma Alex Lifeson. "Sempre há uma canção em cada álbum que parece nascer como nenhuma outra. Essa música reflete um casamento perfeito de todas as partes: as letras de Neil, a dinâmica, a acústica, o tema celta assombroso e a quebra na sessão mediana, que mostra apenas eu e Geddy".
A concepção de "Resist" recebeu forte participação do co-produtor Peter Collins, que ajudou a banda no alcance de suas verdadeiras pretensões:
"Peter Collins é um ótimo cara", diz Geddy. "Tenho muito respeito por ele, pois é alguém que traz em si a capacidade de lidar com um projeto de forma muito responsável, sempre nos alertando objetivamente em termos de engenharia de som e tudo mais. Sentimos que sua motivação é sempre a de fazer o melhor disco possível. O mais importante de tudo é que ele respira música, não sendo apenas um engenheiro. Está sempre por perto peneirando as coisas, e qualquer decisão ou ideia que precisemos sabemos que sua resposta será sempre baseada no interesse de fazer a melhor canção possível. Isso tem um valor inestimável. Em nossa caminhada, esse fato aconteceu muitas vezes, especialmente em Test For Echo. Tivemos uma série de canções que, ao observá-las, ele disse, 'Pessoal, francamente, essa canção ainda não está pronta'. E, em outros casos, no período das demos, ele ouvia e dizia, 'Não há mais nada para trazer para essas. Estão ótimas assim'. Damos muito valor às opiniões de pessoas que respeitamos, algo que nos traz a confiança de seguirmos em frente. Dessa forma, ocorreram algumas composições, como 'Resist', na qual ele arregaçou as mangas dizendo, 'Essa ainda precisa de trabalho. Vamos mergulhar nela'. Daí, você separa a música em pedaços e força algumas mudanças. Acho que essa foi uma das que mais sentiram seu impacto".
"Na fase inicial de composições, fazemos nossas demos antes de tocá-las para Peter", continua o baixista. "Compomos nossas músicas e seguimos gravando demos para elas. Basicamente, fazemos o disco todo numa escala menor, com bateria, guitarras e vocais capturados por Alex. Assim, ficamos com uma fita nas mãos, a qual será mostrada ao Peter. Ele ouve as canções e dá sua opinião sobre quais precisam ser mais trabalhadas e quais não precisam. Tivemos muitas que ele achava que não devíamos mudar coisa alguma, dizendo, 'Essas estão boas como estão'. Daí, começávamos a gravá-las sem nenhuma modificação nos arranjos. Porém, ocorreram outras como 'Resist' e 'Totem', sobre as quais ele não estava feliz com os arranjos, sugerindo que as reorganizássemos. Para ilustrar bem o processo, vamos até a fazenda para compor e, nesse estágio, montamos o álbum como um esboço. Temos guitarras, vocais, baixo e tudo mais, mas feitos de uma forma meio áspera - não tomamos muito cuidado com a gravação. Utilizamos qualquer equipamento antigo, a fim de produzir uma ideia do que será a canção. Posteriormente, levamos o material para o produtor e ele diz se gostou ou não - se estamos perdendo tempo ou se estamos no caminho certo [risos]".
"Resist", de forma geral, expõe um clamor em prol da capacidade humana de escrever sua própria história, a partir da liberdade, perseverança e confiança na busca de objetivos. Traz mensagens claras e positivas sobre adaptação, alcance e superação de sonhos, além do uso da não-conformidade e da força pessoal para superar momentos desfavoráveis, temas que apontam muitos clássicos anteriores como "Mission" (de Hold Your Fire, 1987) e "Bravado" (de Roll The Bones, 1991).
Peart se baseia em dois pilares para sustentar suas ideias, e que são claramente evidenciados a partir da estrofe inicial. Primeiramente, a frase "I can learn to resist, anything but temptation" ("Posso aprender a resistir à tudo, menos à tentação") é uma inspiração direta da comédia cômica de costumes O Leque de Lady Windermere, escrita pelo dramaturgo irlandês Oscar Wilde (1854 - 1900) em 1892. Apresentada pela primeira vez em 22 de fevereiro daquele ano no St James Theatre em Londres, a obra satiriza a moral da sociedade vitoriana, expondo numa de suas passagens o trecho "Posso resistir a tudo, menos às tentações", fala do personagem Lord Darlington e que acabou se tonando um dos paradoxos mais famosos do escritor.
"Utilizei a citação de Oscar Wilde acrescentando que posso aprender a resistir", explica Peart. "Em outras palavras, o exercício da vontade é a arma contra a futilidade e o desamparo. Talvez não consiga resistir à tentação, mas posso aprender a conviver com o que eu não sei. Achei essa distinção muito importante".
Como em "Totem", "Resist" também foi inspirada no livro Totem e Tabu, escrito em 1913 pelo neurologista e psiquiatra austríaco Sigmund Freud (1856 - 1939). A obra mostra uma análise da gênese dos totens (símbolos sagrados e respeitados) e dos tabus (proibições de origem incerta), elementos que cercam e cerceiam as liberdades individuais e coletivas. Essa interessante abordagem acaba combinando as duas canções tematicamente, com totem representando as adorações humanas e tabu ("Resist") os temores. O segundo termo chegou a ser cogitado para dar nome à faixa em questão.
"Ao lado de 'Totem', chamávamos no começo a canção 'Resist' de 'Tabu', pois queria ter esses dois elementos que tanto tememos juntos", explica o letrista. "Assim como 'The Color of Right', 'Resist' também olha para as questões da moralidade, pensando no que ela consiste e porque a mesma se apresenta diferente de pessoa para pessoa".
A partir desse prisma, "Resist" enfatiza a discussão da gênese moral e, mais especificamente, da relação estabelecida entre lei e desejo. É neste contexto que emerge o estudo do tabu - um termo de origem polinésia que apresenta significações antagônicas, como a de sagrado e consagrado por um lado e de inquietante, perigoso e impuro por outro. Freud atribui uma importância especial ao tabu por duas razões: por sugerir que o mesmo pode se revelar esclarecedor para a compreensão da noção do imperativo categórico (um dos principais conceitos da filosofia kantiana, que consiste no agir que se baseia nos princípios que desejamos ver aplicados universalmente) e também por perceber a existência de uma íntima relação entre tabus primitivos e as proibições e convenções morais vigentes na sociedade. Além dessas definições, o tabu pode implicar a ideia de proteção e prevenção contra eventuais ações que representem perigo ou ameaça e, neste sentido, sua violação seria motivo de punição / castigo, indicando os primeiros sistemas penais humanos.
Ao transgredir um tabu, o indivíduo que age está relegado a ser o próprio tabu. Interessante observar que qualquer um que tenha transgredido uma dessas proibições adquire, ele mesmo, a característica de ser proibido - como se toda a carga perigosa tivesse sido transferida para ele. Verifica-se, portanto, que o castigo prescrito pelo tabu, relativo ao contato com o interditado, aparece como um meio de alçar o objeto desejado ao estatuto de um objeto impossível. Essa expressão de desejo e, ao mesmo tempo, de temor, levou Freud a crer que, assim como os povos primitivos sustentam tal atitude ambivalente, a origem do tabu aparece como algo imposto por uma autoridade externa e não passível de demonstração ou clarificação. O interesse do autor é orientado na verificação de que esses fatores, inerentes ao tabu, aparecem e constituem a dominância de tendências opostas e contraditórias.
Peart utiliza o conceito relacionando a luta contra os medos e fraquezas provenientes da opressão, de situações e das realidades particulares que podem impossibilitar a plenitude do desenvolvimento humano. Questões como dogmas religiosos, filosofias ou relacionamentos podem criar amarras quase intransponíveis para muitas pessoas, fazendo com que desistam dos seus pontos de vista genuínos, dos seus sonhos ou de suas inclinações naturais. O baterista incita que, mesmo com crenças, tradições e impasses inerentes à todas as vidas, sempre existe a possibilidade do alcance de decisões e posicionamentos verdadeiramente pessoais. Em "Resist", há pontuações sobre a aprendizagem da resistência, da coexistência, da harmonia, da persistência e da convivência com questões de difíceis explicações. Em contrapartida, temos a declaração de que elementos como tristeza, desejos, frustrações, falta de ousadia e injustiça não devem ser negligenciados ou ignorados. O homem é uma soma de falhas e acertos, e o que precisamos é cobrir os erros contrabalanceando-os com os pontos fortes, com cada um tendo de fato a própria maneira de enfrentar seu próprio eu. De forma esplêndida e sensível, "Resist" oferece a afirmação central que, independente da inclinação filosófica, cultural e existencial do indivíduo, este deve sempre buscar lutar por seus verdadeiros ideais.
Retomando Oscar Wilde, um dos trechos de seu aclamado romance O Retrato de Dorian Gray (1890) ajuda a sintetizar perfeitamente o cerne de "Resist", mesmo refletindo uma das falas do controverso personagem Lord Henry: "(...) Acredito que se um homem vivesse sua vida plenamente, dando forma a cada sentimento, expessão a cada pensamento e realidade a cada sonho, o mundo se beneficiaria de um novo impulso de energia tão intenso que esqueceríamos de todas as tristezas do medievo para regressar ao ideal helênico, possivelmente para algo mais depurado e mais rico do que o mesmo. Porém, o mais corajoso homem entre nós tem medo de si próprio. A mutilação do selvagem sobrevive tragicamente na autonegação que nos corrompe a vida. Somos castigados pelas nossas renúncias. Cada impulso que tentamos estrangular germina no cérebro e nos envenena. O corpo peca uma vez e acaba com o pecado, porque a ação é um modo de purificação. Nada mais permanece do que a lembrança de um prazer ou o luxo de um remorso. A única maneira de nos livrarmos de uma tentação é cedermos a ela. Se lhe resistirmos, nossa alma adoece com o anseio das coisas que se proibiu, com o desejo daquilo que as suas monstruosas leis tornaram monstruoso e ilegal. Já se disse que os grandes acontecimentos do mundo ocorrem no cérebro. É também no cérebro, e apenas neste, que ocorrem os grandes pecados do mundo (...)".
Geddy Lee, nas apresentações de "Resist" nos shows da turnê Test For Echo, se referia à canção como inspirada pelo filme Braveheart (no Brasil Coração Valente), estrelado e dirigido pelo ator Mel Gibson e lançado em 1995. Recebeu dez indicações ao Oscar, ganhando em cinco categorias, incluindo Melhor Filme e Melhor Direção. A audaciosa saga expõe uma batalha brutal pela independência da Escócia no Século XIII. Quando a esposa de William Wallace (Gibson) é brutalizada pelas tropas inglesas, sua busca por vingança rapidamente transforma-se numa apaixonada luta pela liberdade do seu país. As lendas que contam a bravura de Wallace inspiram os cidadãos comuns e pegaram em armas contra os ingleses, transformando sua cruzada numa guerra de grandes proporções.
"Hugh Syme e eu trabalhamos em imagens para acompanhar cada canção e, uma vez que a maioria delas foi capaz de carregar mais do que algumas metáforas ou sombras de significados, odiaria limitá-las a uma definição absoluta, explica Peart. Na ilustração do encarte para 'Resist', quis utilizar algo que pudesse dizer por si mesmo 'não se renda', aliado ao pensamento ilustrado por uma placa de 'proibido retornar', o que traz uma visão apropriadamente oblíqua. Os alpinistas, claro, oferecem outra metáfora sobre o progresso pessoal ou sobre a aprendizagem, mesmo que soe como uma reviravolta irônica na canção. Por exemplo, o que mais você pode esperar comprometer exceto seus próprios desejos? Outro subtexto na canção é aprender a aceitar suas verdadeiras limitações".
© 2016 Rush Fã-Clube Brasil
Um novo momento para Test For Echo. Após a sequência de canções carregadas de obscuridade e peso no disco (porém atenuadas por doses melódicas sutis), a nona faixa é reservada à belíssima e tocante "Resist", uma balada comovente que integra certamente o rol das criações mais cativantes e inspiradoras de toda carreira do Rush. Retomando uma de suas mais fortes características líricas, a banda constrói com maestria outro exuberante hino ao otimismo, persistência, atitude e força humana, criando um paralelo com o reconhecimento profundo das limitações pessoais e aliceçando suas ideias numa composição musical doce e admirável.
Conforme as gradativas abordagens sobre o amor, o trio trilhou suas várias fases explorando a produção de canções mais calmas, com estas acontecendo cada vez mais poderosas e comoventes. Instantaneamente agradável, "Resist" consegue transmitir o talento dos músicos numa roupagem de grande sensibilidade e refinamento. Os vocais de Geddy Lee soam grandiosos, e talvez sua performance possa ser definida como uma das mais competentes capturas de percepções exigidas pelas letras da banda. Temos, portanto, uma joia absoluta, brilhante em todos os seus elementos.
"'Resist' é uma das melhores canções que já escrevemos", afima Geddy. "Sabia, desde o começo, que se tratava de algo muito especial para o Rush - só pelo tipo de energia que visitou a todos enquanto a escrevíamos e gravávamos".
Para a introdução de "Resist", Neil Peart utiliza um Dulcimer, instrumento de percussão medieval na forma de um trapézio, composto por uma caixa acústica de madeira com cordas metálicas de aço dispostas horizontalmente. O som é produzido quando as cordas são batidas por baquetas no formato de pequenos martelos, estes que produzem uma atmosfera vibrante, seca e metálica. O seguimento da canção mergulha numa base sensível de violões, aliados à finas camadas de baixo e vocais dobrados, elementos que evocam nuances do folk rock e que sempre atraem linhas de bateria de grande presença e esmero. Mesclando delicadeza e vigor, "Resist" oferece ainda elementos resplandecentes como guitarras celtas flutuantes e uma ponte solitária criada para uma das citações mais profundas de todo o disco. Finalmente, temos uma tocante divisão dos elementos acústicos entre os canais, com os pratos (acionados suavemente), carregando o cenário para uma explosão de overdubs, ações que eclodem efeitos primorosos e essenciais para a mensagem proposta.
"'Resist' é uma das minhas favoritas desde o começo, e uma das nossas melhores composições", afirma Alex Lifeson. "Sempre há uma canção em cada álbum que parece nascer como nenhuma outra. Essa música reflete um casamento perfeito de todas as partes: as letras de Neil, a dinâmica, a acústica, o tema celta assombroso e a quebra na sessão mediana, que mostra apenas eu e Geddy".
A concepção de "Resist" recebeu forte participação do co-produtor Peter Collins, que ajudou a banda no alcance de suas verdadeiras pretensões:
"Peter Collins é um ótimo cara", diz Geddy. "Tenho muito respeito por ele, pois é alguém que traz em si a capacidade de lidar com um projeto de forma muito responsável, sempre nos alertando objetivamente em termos de engenharia de som e tudo mais. Sentimos que sua motivação é sempre a de fazer o melhor disco possível. O mais importante de tudo é que ele respira música, não sendo apenas um engenheiro. Está sempre por perto peneirando as coisas, e qualquer decisão ou ideia que precisemos sabemos que sua resposta será sempre baseada no interesse de fazer a melhor canção possível. Isso tem um valor inestimável. Em nossa caminhada, esse fato aconteceu muitas vezes, especialmente em Test For Echo. Tivemos uma série de canções que, ao observá-las, ele disse, 'Pessoal, francamente, essa canção ainda não está pronta'. E, em outros casos, no período das demos, ele ouvia e dizia, 'Não há mais nada para trazer para essas. Estão ótimas assim'. Damos muito valor às opiniões de pessoas que respeitamos, algo que nos traz a confiança de seguirmos em frente. Dessa forma, ocorreram algumas composições, como 'Resist', na qual ele arregaçou as mangas dizendo, 'Essa ainda precisa de trabalho. Vamos mergulhar nela'. Daí, você separa a música em pedaços e força algumas mudanças. Acho que essa foi uma das que mais sentiram seu impacto".
"Na fase inicial de composições, fazemos nossas demos antes de tocá-las para Peter", continua o baixista. "Compomos nossas músicas e seguimos gravando demos para elas. Basicamente, fazemos o disco todo numa escala menor, com bateria, guitarras e vocais capturados por Alex. Assim, ficamos com uma fita nas mãos, a qual será mostrada ao Peter. Ele ouve as canções e dá sua opinião sobre quais precisam ser mais trabalhadas e quais não precisam. Tivemos muitas que ele achava que não devíamos mudar coisa alguma, dizendo, 'Essas estão boas como estão'. Daí, começávamos a gravá-las sem nenhuma modificação nos arranjos. Porém, ocorreram outras como 'Resist' e 'Totem', sobre as quais ele não estava feliz com os arranjos, sugerindo que as reorganizássemos. Para ilustrar bem o processo, vamos até a fazenda para compor e, nesse estágio, montamos o álbum como um esboço. Temos guitarras, vocais, baixo e tudo mais, mas feitos de uma forma meio áspera - não tomamos muito cuidado com a gravação. Utilizamos qualquer equipamento antigo, a fim de produzir uma ideia do que será a canção. Posteriormente, levamos o material para o produtor e ele diz se gostou ou não - se estamos perdendo tempo ou se estamos no caminho certo [risos]".
"Resist", de forma geral, expõe um clamor em prol da capacidade humana de escrever sua própria história, a partir da liberdade, perseverança e confiança na busca de objetivos. Traz mensagens claras e positivas sobre adaptação, alcance e superação de sonhos, além do uso da não-conformidade e da força pessoal para superar momentos desfavoráveis, temas que apontam muitos clássicos anteriores como "Mission" (de Hold Your Fire, 1987) e "Bravado" (de Roll The Bones, 1991).
Peart se baseia em dois pilares para sustentar suas ideias, e que são claramente evidenciados a partir da estrofe inicial. Primeiramente, a frase "I can learn to resist, anything but temptation" ("Posso aprender a resistir à tudo, menos à tentação") é uma inspiração direta da comédia cômica de costumes O Leque de Lady Windermere, escrita pelo dramaturgo irlandês Oscar Wilde (1854 - 1900) em 1892. Apresentada pela primeira vez em 22 de fevereiro daquele ano no St James Theatre em Londres, a obra satiriza a moral da sociedade vitoriana, expondo numa de suas passagens o trecho "Posso resistir a tudo, menos às tentações", fala do personagem Lord Darlington e que acabou se tonando um dos paradoxos mais famosos do escritor.
"Utilizei a citação de Oscar Wilde acrescentando que posso aprender a resistir", explica Peart. "Em outras palavras, o exercício da vontade é a arma contra a futilidade e o desamparo. Talvez não consiga resistir à tentação, mas posso aprender a conviver com o que eu não sei. Achei essa distinção muito importante".
Como em "Totem", "Resist" também foi inspirada no livro Totem e Tabu, escrito em 1913 pelo neurologista e psiquiatra austríaco Sigmund Freud (1856 - 1939). A obra mostra uma análise da gênese dos totens (símbolos sagrados e respeitados) e dos tabus (proibições de origem incerta), elementos que cercam e cerceiam as liberdades individuais e coletivas. Essa interessante abordagem acaba combinando as duas canções tematicamente, com totem representando as adorações humanas e tabu ("Resist") os temores. O segundo termo chegou a ser cogitado para dar nome à faixa em questão.
"Ao lado de 'Totem', chamávamos no começo a canção 'Resist' de 'Tabu', pois queria ter esses dois elementos que tanto tememos juntos", explica o letrista. "Assim como 'The Color of Right', 'Resist' também olha para as questões da moralidade, pensando no que ela consiste e porque a mesma se apresenta diferente de pessoa para pessoa".
A partir desse prisma, "Resist" enfatiza a discussão da gênese moral e, mais especificamente, da relação estabelecida entre lei e desejo. É neste contexto que emerge o estudo do tabu - um termo de origem polinésia que apresenta significações antagônicas, como a de sagrado e consagrado por um lado e de inquietante, perigoso e impuro por outro. Freud atribui uma importância especial ao tabu por duas razões: por sugerir que o mesmo pode se revelar esclarecedor para a compreensão da noção do imperativo categórico (um dos principais conceitos da filosofia kantiana, que consiste no agir que se baseia nos princípios que desejamos ver aplicados universalmente) e também por perceber a existência de uma íntima relação entre tabus primitivos e as proibições e convenções morais vigentes na sociedade. Além dessas definições, o tabu pode implicar a ideia de proteção e prevenção contra eventuais ações que representem perigo ou ameaça e, neste sentido, sua violação seria motivo de punição / castigo, indicando os primeiros sistemas penais humanos.
Ao transgredir um tabu, o indivíduo que age está relegado a ser o próprio tabu. Interessante observar que qualquer um que tenha transgredido uma dessas proibições adquire, ele mesmo, a característica de ser proibido - como se toda a carga perigosa tivesse sido transferida para ele. Verifica-se, portanto, que o castigo prescrito pelo tabu, relativo ao contato com o interditado, aparece como um meio de alçar o objeto desejado ao estatuto de um objeto impossível. Essa expressão de desejo e, ao mesmo tempo, de temor, levou Freud a crer que, assim como os povos primitivos sustentam tal atitude ambivalente, a origem do tabu aparece como algo imposto por uma autoridade externa e não passível de demonstração ou clarificação. O interesse do autor é orientado na verificação de que esses fatores, inerentes ao tabu, aparecem e constituem a dominância de tendências opostas e contraditórias.
Peart utiliza o conceito relacionando a luta contra os medos e fraquezas provenientes da opressão, de situações e das realidades particulares que podem impossibilitar a plenitude do desenvolvimento humano. Questões como dogmas religiosos, filosofias ou relacionamentos podem criar amarras quase intransponíveis para muitas pessoas, fazendo com que desistam dos seus pontos de vista genuínos, dos seus sonhos ou de suas inclinações naturais. O baterista incita que, mesmo com crenças, tradições e impasses inerentes à todas as vidas, sempre existe a possibilidade do alcance de decisões e posicionamentos verdadeiramente pessoais. Em "Resist", há pontuações sobre a aprendizagem da resistência, da coexistência, da harmonia, da persistência e da convivência com questões de difíceis explicações. Em contrapartida, temos a declaração de que elementos como tristeza, desejos, frustrações, falta de ousadia e injustiça não devem ser negligenciados ou ignorados. O homem é uma soma de falhas e acertos, e o que precisamos é cobrir os erros contrabalanceando-os com os pontos fortes, com cada um tendo de fato a própria maneira de enfrentar seu próprio eu. De forma esplêndida e sensível, "Resist" oferece a afirmação central que, independente da inclinação filosófica, cultural e existencial do indivíduo, este deve sempre buscar lutar por seus verdadeiros ideais.
Retomando Oscar Wilde, um dos trechos de seu aclamado romance O Retrato de Dorian Gray (1890) ajuda a sintetizar perfeitamente o cerne de "Resist", mesmo refletindo uma das falas do controverso personagem Lord Henry: "(...) Acredito que se um homem vivesse sua vida plenamente, dando forma a cada sentimento, expessão a cada pensamento e realidade a cada sonho, o mundo se beneficiaria de um novo impulso de energia tão intenso que esqueceríamos de todas as tristezas do medievo para regressar ao ideal helênico, possivelmente para algo mais depurado e mais rico do que o mesmo. Porém, o mais corajoso homem entre nós tem medo de si próprio. A mutilação do selvagem sobrevive tragicamente na autonegação que nos corrompe a vida. Somos castigados pelas nossas renúncias. Cada impulso que tentamos estrangular germina no cérebro e nos envenena. O corpo peca uma vez e acaba com o pecado, porque a ação é um modo de purificação. Nada mais permanece do que a lembrança de um prazer ou o luxo de um remorso. A única maneira de nos livrarmos de uma tentação é cedermos a ela. Se lhe resistirmos, nossa alma adoece com o anseio das coisas que se proibiu, com o desejo daquilo que as suas monstruosas leis tornaram monstruoso e ilegal. Já se disse que os grandes acontecimentos do mundo ocorrem no cérebro. É também no cérebro, e apenas neste, que ocorrem os grandes pecados do mundo (...)".
Geddy Lee, nas apresentações de "Resist" nos shows da turnê Test For Echo, se referia à canção como inspirada pelo filme Braveheart (no Brasil Coração Valente), estrelado e dirigido pelo ator Mel Gibson e lançado em 1995. Recebeu dez indicações ao Oscar, ganhando em cinco categorias, incluindo Melhor Filme e Melhor Direção. A audaciosa saga expõe uma batalha brutal pela independência da Escócia no Século XIII. Quando a esposa de William Wallace (Gibson) é brutalizada pelas tropas inglesas, sua busca por vingança rapidamente transforma-se numa apaixonada luta pela liberdade do seu país. As lendas que contam a bravura de Wallace inspiram os cidadãos comuns e pegaram em armas contra os ingleses, transformando sua cruzada numa guerra de grandes proporções.
"Hugh Syme e eu trabalhamos em imagens para acompanhar cada canção e, uma vez que a maioria delas foi capaz de carregar mais do que algumas metáforas ou sombras de significados, odiaria limitá-las a uma definição absoluta, explica Peart. Na ilustração do encarte para 'Resist', quis utilizar algo que pudesse dizer por si mesmo 'não se renda', aliado ao pensamento ilustrado por uma placa de 'proibido retornar', o que traz uma visão apropriadamente oblíqua. Os alpinistas, claro, oferecem outra metáfora sobre o progresso pessoal ou sobre a aprendizagem, mesmo que soe como uma reviravolta irônica na canção. Por exemplo, o que mais você pode esperar comprometer exceto seus próprios desejos? Outro subtexto na canção é aprender a aceitar suas verdadeiras limitações".
© 2016 Rush Fã-Clube Brasil
ELLIOTT, P. "Everyone Loves Rush". Classic Rock #211. July 2015.
MARSHALL, W. "Alex Lifeson: The Making Of A Guitar Legend". Guitar One Volume 5 Number 34. September/October 1996.
STREETER, S. "Live On Paper! - The Steve Streeter And Neil Peart Interview". A Show Of Fans #17. Summer 1997.
MYERS, P. "Rush Put Themselves To The "Test" / (And End Up Even Closer To The Heart)". Canadian Musician. December / 1996.
STREETER, S. "A Show Of Fans Speaks With Geddy Lee" and "Ask Big Al" (Installment Two). A Show Of Fans #15. Fall 1996.