A PASSAGE TO BANGKOK



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2112  A PASSAGE TO BANGKOK  THE TWILIGHT ZONE


A PASSAGE TO BANGKOK

Our first stop is in Bogota
To check Colombian fields
The natives smile and pass along
A sample of their yield
Sweet Jamaican pipe dreams
Golden Acapulco nights
Then Morocco, and the East,
Fly by morning light

We're on the train to Bangkok
Aboard the Thailand Express
We'll hit the stops along the way
We only stop for the best

Wreathed in smoke in Lebanon
We burn the midnight oil
The fragrance of Afghanistan
Rewards a long day's toil
Pulling into Katmandu
Smoke rings fill the air
Perfumed by a Nepal night
The Express gets you there
UMA PASSAGEM PARA BANGKOK

Nossa primeira parada é em Bogotá
Para checar os campos colombianos
Os nativos sorriem e repassam
Uma mostra de sua produção
Sonhos de um doce pipe jamaicano
Noites douradas em Acapulco
Em seguida Marrocos, e o Oriente,
Voe pela luz da manhã

Estamos no trem para Bangkok
A bordo do Expresso da Tailândia
Atingiremos as paradas ao longo do caminho
Só vamos parar para o melhor

Envoltos pela fumaça no Líbano
Queimamos o óleo da meia-noite
A fragrância do Afeganistão
Recompensa a fadiga de um longo dia
Embarcando em Katmandu
Anéis de fumaça enchem o ar
Perfumados por uma noite no Nepal
O Expresso te leva até lá


Música por Geddy Lee e Alex Lifeson / Letra por Neil Peart


Uma viagem onírica envolta por um aroma especial

Após a prodigiosa faixa-título, 2112 muda de cenário completamente com "A Passage to Bangkok". Trata-se de uma canção mais curta, cativante e muito bem trabalhada que descreve um circuito por países que revelam uma realidade em comum: a forte ligação com o narcotráfico e com o consumo de drogas. A composição, que abria o antigo lado B do vinil, propõe um curioso trajeto onírico por pontos das Américas do Sul, Central e do Norte, além de também visitar locais exóticos da África e Ásia.

"A Passage to Bangkok" surge como outro exemplo de uma das mais fortes características do Rush: o humor sutil. Como verdadeiros peritos em Tetraidrocanabinol, os canadenses desenham uma espécie de turismo das drogas, destacando especialmente a maconha. A letra, de forma poética, traz várias insinuações inteligentes que evitam a utilização dos nomes reais das substâncias. Visitando países como Colômbia, México, Jamaica, Marrocos, Tailândia, Afeganistão, Nepal e Líbano, as menções são sempre feitas como "anéis de fumaça", "pipe dos sonhos", "fragrâncias" e "nativos que dão boas-vindas com mostras dos seus produtos".

A construção instrumental e lírica evoca um mergulho nessa rota imaginária, retratando lugares que jamais haviam sido visitados pelos próprios integrantes. Segundo Peart, a intenção primordial era a de escrever uma canção que soasse divertida, que abordasse em tom de gozação um material em torno do consumo de drogas na década de 1970. "A Passage to Bangkok" consegue, portanto, expor mais uma vez a comicidade peculiar do grupo, além de revelar uma das preferências recreativas dos músicos em um período em que qualquer experimentação era considerada válida, e a apologia ao uso de drogas no meio artístico era habitual, tendo em vista que ainda não se tinham noções reais das consequências do uso prolongado de forma individual e coletiva. Dessa forma, a canção se tornou um exemplo de materialização dos movimentos socioculturais da época, além de simbolizar uma famosa afirmação da banda, que considera seu público como um dos mais "aromáticos" no mundo da música.

Embora "A Passage to Bangkok" aborde o consumo de drogas, os integrantes do Rush nunca foram conhecidos pelo público e pela mídia como usuários assíduos. Alex Lifeson admitiu ter fumado haxixe após um doloroso procedimento odontológico no começo dos anos de 1970, além afirmar que toda a banda utilizou maconha no período dos primeiros discos. Já Neil Peart, admitiu ter usado LSD de forma leve na juventude. "Fumávamos muita maconha naquele momento", diz Alex. "Rimos muito dessas coisas que são retratadas na canção. Ela traz uma pequena e divertida viagem para todos os bons lugares onde você poderia puxar um fumo. Achamos que seria divertido escrever algo sobre o assunto, e acho que Neil fez isso de uma forma muito eloquente. Acredito que essa canção tenha sido escrita provavelmente em uma fazenda, num violão, de frente para um tocador de cassetes ou algo do tipo. Gravamos dessa forma e, em seguida, descemos ao porão para ensaiar".

A bateria de Peart consegue acrescentar bastante expressão nas linhas de guitarra de Lifeson, principalmente quando utilizada na representação de sinos orientais nos cowbells. O guitarrista oferece uma curiosa variação do clássico Oriental Riff, também conhecido como Riff da Ásia, elemento que é frequentemente abordado na cultura ocidental como um estereótipo do orientalismo, representando uma espécie de som geral do Leste Asiático. Além disso, um sintetizador surge rapidamente antes do solo de guitarra, soando como a imagem de alguém tragando um baseado.

Peart tomou emprestado para a canção o título do famoso romance A Passage to India (1924), do romancista britânico E.M. Forster (1879 - 1970). No final da década de 1920, Adela Quested, uma rica inglesa liberal, e sua sogra, decidem partir para a Índia (então sob domínio britânico), a fim de encontrar seu noivo e decidir pelo casamento e residência fixa no país. O clima, as diferenças culturais e religiosas, a postura colonialista adotada e a atitude dos britânicos com o povo indiano chocam as inglesas recém-chegadas. Interessadas em conhecer a "Verdadeira Índia", ambas fazem amizade com o Dr. Aziz, um gentil médico indiano. Da mesma forma, a canção descreve uma viagem a locais de culturas diversas, porém abrindo um livro de memórias de um explorador sempre envolto por uma fumaça aromática em um heavy rock muito interessante.

Alex Lifeson cita "Kashmir", da banda britânica Led Zeppelin, como uma influência indireta para "A Passage To Bangkok". Ele se refere às melodias fortemente sincopadas de ambas as canções, em que cada uma das notas se situa entre batidas em vez de se encaixarem, o que cria um efeito estendido. Além disso, as composições apresentam uma disjunção entre os riffs e melodias vocais, trazendo um ritmo mais lento e frases não alinhadas. Como resultado, temos uma estratificação rítmica da melodia que parece flutuar sobre o acompanhamento, separado deste. Tal efeito flutuante e desarticulado é altamente apropriado às letras, tendo em vista que "Kashmir" também reflete viagens ao redor do mundo, embora seja menos relacionada às drogas e musicalmente mais exótica. Por fim, o descompasso entre voz e instrumentos nas duas canções consegue evocar mais um estado de espírito do que os locais físicos.

"Essa canção é absolutamente brilhante, um clássico de todos os tempos", afirma Lifeson. "'Kashmir' tem uma sensação maravilhosa e exótica do Oriente Médio. Physical Graffiti é um álbum alucinante, não há nada igual em sua era. De uma forma indireta, 'Kashmir' influenciou 'A Passage to Bangkok', que tem um tipo semelhante de arranjo estranho e andamento para os versos".

Colômbia - A primeira parada do Rush é em Bogotá, capital da Colômbia. Esse país, um dos mais problemáticos das Américas, é conhecido por ser um dos maiores fornecedores de cocaína e heroína no mundo. Peart menciona, nesse trecho inicial, uma visita aos "campos colombianos", relatando "os nativos que dão boas-vindas com mostras dos seus produtos", o que denota, pelo enredo, uma referência a uma plantação de Marijuana, onde cultivadores oferecem provas da erva aos viajantes. Até meados do século XX, a droga era utilizada pelas classes populares do país no alívio de dores provenientes do reumatismo e da artrite. O setor agrícola colombiano é formado por culturas de café, cana-de-açúcar, banana, milho, tabaco, algodão, legumes, frutas e flores, porém, sua exportação mais significativa, apesar de ilegal, está ligada ao narcotráfico. O país consegue ser o primeiro produtor de maconha do continente, além de funcionar como o principal processador de folhas de coca provenientes do Peru, Equador e Bolívia, e de ser também o primeiro exportador de cocaína para os Estados Unidos. A cifra dos negócios do narcotráfico está estimada em 6 bilhões de dólares ao ano, o que corresponde a 10% do PIB colombiano.

Jamaica - A segunda parada de "A Passage to Bangkok" leva os viajantes ao Caribe, na América Central, mais precisamente para a Jamaica. Aqui são citados os "Doces sonhos de um pipe jamaicano", referência a um modelo específico de cachimbo de combustão interna. A maconha é venerada na Jamaica pelos rastafáris e bastante consumida, cultivada e traficada. Conhecida como Ganja, seu uso, cultivo e produção são populares, embora seu consumo seja considerado ilegal. Certas seitas atribuem à erva poderes místicos e divinos, especialmente o de afastar os maus espíritos. O operário jamaicano encontra na Ganja energia para o trabalho e relaxamento após este, sendo o fumo a representação de um rito e não somente um fator de alienação ou desintegração social - seu uso constitui um complexo de crenças, atitudes e costumes compartilhados por grande parte da comunidade. Porém, há diferenças entre as classes sociais. Na população de baixa renda, os jovens começam a usar a erva muito cedo, e nas classes mais altas a droga é condenada. Os adolescentes fazem uso expressando oposição à geração adulta, e a Cannabis se torna um símbolo de curiosidade, prazer e até mesmo revolta.

México - Peart menciona "noites douradas" na cidade litorânea de Acapulco, México, país que também apresenta altos índices de tráfico de drogas, principalmente na costa do pacífico. Nos Estados Unidos, os cada vez mais numerosos mexicanos faziam bastante uso - meio milhão deles cruzaram o Rio Grande entre 1915 e 1930 em busca de trabalho. Muitos não conseguiram se alocar em uma atividade remunerada, ou seja, em boa parte do Ocidente, o ato de fumar maconha acabou relegado às classes marginalizadas e visto com antipatia pela classe média branca. Nessa época, foi crescente o repúdio contra a maconha, visto que a droga se alastrava pela nação mais poderosa do globo. Esse fato ainda se intensificou com a quebra da Bolsa em 1929, acontecimento histórico que afundou os EUA numa recessão. No sul do país corria o boato de que a droga dava força sobre-humana aos mexicanos, o que seria uma vantagem injusta na disputa pelos escassos empregos. A isso se somavam insinuações de que a droga induzia ao sexo promíscuo (muitos mexicanos talvez tivessem mais parceiros que um americano puritano) e ao crime (com a crise, a criminalidade aumentou entre os mexicanos pobres). Baseados nesses boatos, vários estados começaram a proibir o produto. Nessa época, a maconha se tornou a droga de escolha dos músicos do jazz, que afirmavam ficarem mais criativos depois de fumar.

Curiosamente, Acapulco Gold é o nome que designa uma classe especial da erva na região. Apresentando uma coloração marrom e verde dourada em folhas torcidas, a designação também se refere à sua alta qualidade e preço.

Marrocos - Atravessando o Oceano Atlântico, O Rush visita o Marrocos em sua viagem imaginária. Desde o Século XV, os agricultores das Montanhas do Rife cultivam Maconha, normalmente transformando-a em Haxixe. O Marrocos é um dos maiores produtores da droga no planeta, e parte grande do PIB é totalmente dependente desses produtos. Durante décadas, o Haxixe marroquino tem sido um sustentáculo dos mercados europeus, e o governo se esforça agressivamente para erradicar os cultivos e dissolver cartéis. Cerca de 96 mil famílias sobrevivem do seu plantio e preparação, com o escoamento da produção para a Europa acontece principalmente na região montanhosa, localizada ao Norte.

Líbano - Aqui começa a grande jornada pela Ásia. A bordo do fictício Expresso da Tailândia, com destino à capital Bangkok, temos a primeira parada que Líbano, grande exportador de maconha e de resina canábica. No vale do Bekaa, aos pés do Monte Líbano, proliferam os cultivos de maconha. Os plantadores sempre se aproveitaram da instabilidade política para realizar suas atividades, e os governos nunca conseguiram colocar em prática os anunciados projetos de erradicação da droga libanesa.

Afeganistão - Peart ressalta durante o trajeto a "fragrância" afegã, e a "queima do óleo da meia-noite", que referem-se a produção de outro narcótico, o Ópio. Em vários países subdesenvolvidos, a falta de opções leva boa parte dos camponeses a trabalhar no cultivo de plantas como a Papoula, que está na base da produção industrial dessa droga. O Afeganistão é o principal produtor de ópio no mundo, cuja superfície dedicada ao cultivo ultrapassa a dedicada à cocaína na Colômbia, Peru e Bolívia juntos. O ópio afegão representa 93% da produção mundial, e nenhum outro país produzia narcóticos em escala semelhante desde a China do século 19. O ópio é um suco espesso que se extrai dos frutos imaturos (cápsulas) de várias espécies de papoulas soníferas, e seu uso mascado ou fumado que se espalhou pelo Oriente, reduzindo a capacidade de trabalho e provocando enfraquecimento físico.

Nepal -
A última parada é em Katmandu, capital do Nepal. A Cannabis é bastante consumida em rituais religiosos nesse país, e são datadas do terceiro milênio a.C. as primeiras evidências de sua utilização. A erva é conhecida entre os Hindus como Ganjika, e sua utilização é proibida, mas uma brecha judicial permite que os homens santos, conhecidos como Sadhus, a fumem durante uma noite nas celebrações a Shiva, um dos seus deuses. Milhares de peregrinos viajam ao todos os anos para o Templo de Pashupatinath, localizado em Katmandu, todos os anos para marcar o Maha Shivaratri, feriado festivo indiano e nepalês.

© 2014 Rush Fã-Clube Brasil

TELLERIA, E. "Merely Players Tribute". Quarry Music Books, 2002.
BERTI, J. Rush and Philosophy: "Heart and Mind United (Popular Culture and Philosophy)". Chicago: Open Court, 2011.
HIGH TIMES. BIENENSTOCK, D. New York. Issue June, 2012.
SUPERINTERESSANTE. BURGIERMAN, D. NUNES, A. "A Verdade Sobre a Maconha". Brasil, Agosto de 2012. Edição 179.
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